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Plinio Corrêa de Oliveira
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São Nicolau, “Papai Noel” e o significado do Natal


No Natal celebramos o momento culminante da História humana, quando Deus feito homem veio ao mundo e “habitou entre nós”

No Natal celebramos o momento culminante da História humana, quando Deus feito homem veio ao mundo e “habitou entre nós” (1). O nascimento do Menino Jesus constitui um transbordamento incomensurável de amor divino: o Verbo de Deus reveste-se de nossa natureza para reparar como homem ao Padre Eterno todos os nossos pecados e abrir-nos assim as portas do Céu.

A festa da pureza, da família e das crianças

A festa de Natal é, pois, por excelência, a festa da inocência, da pureza, das alegrias castas, serenas e profundas. Aquele terno Menino que repousa num presépio é o “esperado das nações” (2), o Messias cuja única presença restaura a Ordem vulnerada pelo pecado e inaugura a Era da Graça, tornando-nos capazes de praticar todo o bem.

Natal é também a festa da família, porque envolve a Família por excelência, que é a Sagrada Família, constituída pelo Menino Jesus, sua Santíssima Mãe – Virgem antes, durante e depois do parto – e seu pai legal, o patriarca São José, herdeiro do trono de David.

Sendo a festa da família, o Natal não pode deixar de ser a festa das crianças. Ao longo dos séculos, a Igreja procurou rodeá-lo de manifestações que despertassem também nos pequenos, sentimentos de devoção e piedade para com Aquele “a quem os céus não podem conter” (3), mas que, entretanto, se fez pequenino como eles e para eles.

Foram assim aparecendo costumes – músicas, representações cênicas, orações, comidas, presentes – ou formas especiais de adornar as casas como o Presépio, prática inaugurada por São Francisco de Assis e que se propagou rapidamente por todo o mundo cristão.

Ícone de São Nicolau, escola bizantina.

E assim como o espanhol é o povo que mais se comove com os sofrimentos da Paixão do Redentor e os eslavos os que com mais júbilo celebram a Páscoa da Ressurreição, são sem dúvida os germânicos os que mais se maravilham com o santo mistério do Natal.

Pedagogia natalina: a visita de São Nicolau

Um dos costumes natalinos mais encantadores surgidos na Alemanha é a visita de São Nicolau às crianças, preparando-as para essa grande festividade.

 

E quem é São Nicolau? Sabemos que foi bispo da cidade de Mira, na Licia romana (atual sudeste da Turquia), no século IV, tendo combatido os cultos pagãos e a heresia ariana, a qual negava a dupla natureza divina e humana de Jesus Cristo. Participou do Concílio de Niceia, que definiu os doze artigos da fé católica contidos no Credo. Após uma vida repleta de fatos extraordinários, São Nicolau faleceu em dezembro do ano de 345.

Quando os muçulmanos invadiram a Turquia, suas relíquias foram resgatadas e trasladadas a Bari, na Itália, onde são veneradas até hoje. Iniciou-se assim sua grande fama no Ocidente. A devoção a São Nicolau ficou associada às crianças, porque além de tê-las escolhido como objeto de sua especial caridade, nelas operou muitos milagres, alguns dos quais tão estupendos como a ressurreição de três meninos assassinados por um hospedeiro.

O Bispo São Nicolau, celebrado na Alemanha.

Surgiu por esse motivo na Alemanha medieval um simpático costume, que perdura até hoje em algumas regiões católicas: no dia 6 de dezembro, festa do santo bispo, um venerável “São Nicolau” de barbas brancas, revestido com solenes trajes episcopais, mitra e báculo, visita as casas para perguntar como as crianças procederam durante o ano. As que procederam bem ganham doces e outros presentes, enquanto as mal-procedidas recebem apenas um pequeno pedaço de carvão…

 

Essa visita do santo aos lares era acompanhada de cantos, recitações, etc., e constituía uma excelente forma de gerar nas famílias expectativa pela chegada do Menino Deus.

Esvaziamento e perversão: de São Nicolau ao “Papai Noel”

Mas com a revolução protestante tudo se transtornou. É muito instrutivo verificar como a degradação da figura de São Nicolau acompanha as etapas do processo de decadência da Cristandade descrito por Plinio Corrêa de Oliveira em seu célebre ensaio Revolução e Contra-Revolução:

Durante a Pseudo-Reforma do século XVI, para colocar-se no mesmo nível do igualitarismo calvinista, as vestimentas episcopais de São Nicolau desapareceram na Holanda, sendo substituídas por uma roupa civil. Não tendo os calvinistas hierarquia eclesiástica nem culto aos santos, a própria figura do santo bispo foi diluída e transformada na de um ambíguo personagem chamado “Sinterklaas”, com atributos próprios de seres mitológicos do paganismo nórdico. E assim deformado, no século seguinte passou à colônia holandesa de Nova Amsterdã, na América do Norte (futura Nova York).

De São Nicolau ao Papai Noel comercial…

No século XIX, ao sopro das ideias da Revolução Francesa, essa versão norte-americana do personagem – ao qual se passou chamar “Santa Claus” e que guardava ainda certos vestígios de São Nicolau – se laicizou completamente, transformando-se no fictício “Papai Noel” que hoje conhecemos: um velho de aspecto vulgar, obeso e bonacheirão, sem profissão nem religião conhecida, podendo perfeitamente ser um agnóstico, roncador e mentalmente um tanto decrépito, que reparte presentes não se sabe para quê nem por conta de quem…

Já no século XX, novo passo na decadência: com a hegemonia política iniciada pelos Estados Unidos a partir da vitória aliada na Guerra de 1914-1918, sobreveio uma concomitante hegemonia cultural norte-americana que impôs universalmente os estilos do American way of life.

Com isso, nos anos 30, um “Papai Noel” tosco e proletário, ícone de marketing da Coca-Cola, transformou-se no principal personagem do Natal daquele país, tirando dos espaços públicos das comemorações natalinas as figuras da Sagrada Família e dos Reis Magos, enquanto o Jingle Bells insípido e trepidante substituía as suaves harmonias do Stille Nacht (Noite Feliz) – o canto natalino por excelência – e os tradicionais carols (cânticos) anglo-saxões. Versões ridículas do Papai Noel se difundiram assim por todo o mundo, esvaziando gradualmente o Natal de seu sublime significado original e transformando-o numa mera celebração comercial.

Fim de um processo e certeza de regeneração

Assistimos agora à etapa final desse esvaziamento. Coincidindo com a revolução cultural que ameaça precipitar o Ocidente na mais completa dissolução moral e social, apareceram nas últimas décadas aberrantes “Mamães Noel” – inicialmente extravagantes, depois feministas, mais tarde sensuais e, por fim, pornográficas –, símbolos da perversão revolucionária do Natal.

Assim, das alegrias inocentes à voluptuosidade, da serenidade maravilhada ao frenesi, da pureza aos impulsos infrenes, da luz de Cristo às pompas de satanás, vamos chegamos ao fim de uma pendente de abominação que procura converter a magna festa da Cristandade – a celebração do nascimento do Salvador do mundo – no extremo oposto do que ela substancialmente é.

Mas o verdadeiro Natal não morre: ele continua palpitando nos corações de todos aqueles que adoram o Divino Infante “em espírito e em verdade” (4) e esperam a era de glória para a Igreja e de regeneração e esplendor para a Cristandade, anunciada em Fátima.

* * *

Na base da imagem do precioso Menino Jesus que é venerado no Santuário do Bairro 20 de Julho, em Bogotá, popularizado em todo o orbe católico, lemos esta categórica afirmação: “Eu reinarei”. Com a confiança que nasce da fé, peçamos neste Natal ao Menino Jesus que torne realidade esta promessa, e apresse a vinda de seu Reino, suplicando com toda a Igreja:  “Veni, Dómine, et noli tardáre: relaxa facínora plebis tuae Israel” — “Vem, Senhor, e não tardes: perdoa os pecados de teu povo”. (5)


[1] João 1, 14.

[2] Gn. 49, 10.

[3] Do Officium Parvum B. Mariӕ Virginis, Matinas, 1a Lição.

[4] João 4, 24.

[5] Liturgia do Advento, Domingo IV, Gradual.

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Alejandro Ezcurra

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