Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
7 min — há 8 anos — Atualizado em: 5/1/2017, 9:25:50 PM
Com o título em epígrafe, a BBC de Londres veiculou um documentário em 28/11/2009, dirigido pelo filósofo inglês, Roger Scruton, no qual demonstrou que a partir do início do século XX a humanidade vem perdendo o senso ético e estético da Beleza e passou a prestar um culto à feiura e a consequência disso é um deserto espiritual. Segundo o professor, “nosso mundo virou as costas para a beleza”, de modo que nos encontramos “rodeados de feiura e demência”.
Scruton inicia o seu documentário com um pequeno histórico e descreve as consequências da decadência da arte em nossos dias:
“Em qualquer época entre 1750 e 1930, se você pedisse às pessoas cultas para descrever o objetivo da poesia, da arte ou da música, elas teriam respondido: a Beleza. E se você perguntasse pela razão disso, você aprenderia que a Beleza é um valor, tão importante quanto a Verdade e o Bem.
“Depois, no século XX, a beleza deixou de ser importante. A arte, cada vez mais, concentrou-se em perturbar e em quebrar tabus morais. Não era a beleza, mas a originalidade, conseguida por qualquer meio e a qualquer custo moral, que ganhava os prêmios.
“Não apenas a arte fez um culto à feiura; a arquitetura também se tornou desalmada e estéril. E não foi somente o nosso ambiente físico que se tornou feio. Nossa linguagem, nossa música e nossas maneiras estão cada vez mais rudes, egoístas e ofensivas; como se a beleza e o bom gosto não tivessem nenhum lugar real em nossas vidas. […]
“Eu acho que nós estamos perdendo a beleza e há um risco de que, com isso, nós percamos o sentido da vida.”
A Beleza, segundo Scruton, tem sido o centro de nossa civilização durante mais de dois mil anos. Contudo, especialmente a partir do início do século XX, uma verdadeira revolução vem acontecendo e mudou completamente o sentido da arte.
“Se uma obra de arte não é nada mais que uma ideia – observa Scruton -, qualquer um pode ser um artista e qualquer objeto pode ser uma obra de arte. Não há mais necessidade de habilidade, gosto ou criatividade.
“Então, a arte de hoje nos mostra o mundo como ele é, o aqui e agora com todas suas imperfeições; mas o resultado realmente é arte? Certamente uma coisa não é uma obra de arte somente porque mostra um pedaço da realidade (a feiura incluída) e se auto intitula de ‘arte’. A arte precisa de criatividade, (…) ela é um chamado para que os outros vejam o mundo como o artista o vê.”
Porque os homens viraram as costas à beleza, vivemos num mundo cercado de feiuras
Scruton enfatiza que a beleza importa, não de uma maneira subjetiva, mas como uma necessidade universal dos seres humanos. Ele observa ainda que se ignorarmos isso, nós nos encontraremos num deserto espiritual.
Às vezes a intenção é chocar e isto é feito como se fosse uma elaborada brincadeira de mau gosto, mas os críticos continuam a encorajar tal “arte”. Ninguém tem coragem de dizer “o rei está nu”.
Numa entrevista à BBC, em 05/06/1966, Marchel Duchamp deixou claro o propósito de destruir a verdadeira Arte:
“BBC – O que vc está tentando fazer é desvalorizar a arte. Se eu digo que isto é uma obra de arte, isto se torna uma “obra de arte”…
Duchamp – Sim, mas a expressão “obra de arte” não é importante para mim. Eu não me importo com a palavra “arte” porque isto se tornou tão desacreditada, digamos.
BBC – Mas vc de fato contribuiu para o seu descrédito intencionalmente.
Duchamp – Sim, foi intencional, como uma forma de me livrar dela, assim como muitas pessoas se livraram da religião. (destaque nosso)
Michel Craig-Martin, da Universidade de Yale, ao comentar o urinol de Duchamp, numa entrevista concedida a Scruton, declara: “Essa é parte da função da arte: tornar belo, fazer alguém ver algo como belo, algo que ninguém havia visto como belo até o momento.”
E Scruton retruca, ironicamente: “Bem, como uma ‘lata de fezes’?”
A pergunta o deixa incomodado, e fica sem saber o que responder:
“- Bem, err, não estou .. err.. se é algo bonito, mas está tomando um exemplo que não está tentando ser belo…”
Em uma sociedade consumista, pensa-se em primeiro lugar na utilidade das coisas, enquanto a beleza é colocada em segundo plano. Para tal sociedade, a arte é inútil, por isso não tem valor.
Sendo a arte inútil, não importa o que vc lê, olha ou ouve. Esta é a razão porque a beleza está desaparecendo do nosso mundo.
Uma gota de vida no meio do deserto
No século XX os arquitetos colocaram de lado a beleza e se preocuparam apenas com a utilidade. Eles não se importavam com o que os edifícios pareciam, mas apenas para o que serviam.
O autor conta que quando era pequeno, demoliram uma rua inteira de seu bairro para construir prédios com arquiteturas modernistas que teriam mais “utilidades”, sem nenhuma preocupação com a beleza. Lá construíram uma estação de ônibus e diversos escritórios. Com o tempo, o local foi totalmente abandonado, permanecendo apenas pombos e paredes pichadas. Mas ele não culpa os pichadores, porque os prédios tinham sido construídos por vândalos. Os pichadores apenas terminaram o trabalho. Por todos os lados que se olhava só se via feiura.
No meio daquele lugar horrível sobrou uma pequena construção com arquitetura antiga onde outrora fora uma forjaria e que tinham feito ali um Café bastante frequentado. Aquilo era como uma gota de vida no meio do deserto. E a vida vinha daquele edifício que tinha ficado com aquela arquitetura antiga.
Qual a utilidade da beleza?
Isto fez Scruton pensar no que diz Oscar Wilde, talvez de uma forma irônica, segundo o qual toda arte é absolutamente inútil: “Priorize a utilidade – observa – e você a perderá; priorize a beleza e o que construir será útil para sempre. Ocorre que nada é mais útil do que o inútil. Vemos isso na arquitetura tradicional, com seus adornos sem nenhuma utilidade prática, seus detalhes decorativos. São ornamentos sem a tirania do útil que satisfazem a nossa necessidade de harmonia. Estas coisas que nos fazem sentir em casa. Afinal, não somos governados apenas por necessidades básicas como comer, beber e dormir. Temos necessidades morais e espirituais.” (destaque nosso)
As obras dos homens completam a obra da Criação
São Boaventura nos ensina que há uma semelhança entre a criatura e o Criador. É essa semelhança que nos permite elevar-nos até Deus por meio das criaturas, e é nesse grande anseio de elevação que se deve encontrar o lugar da arte.
O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira escreve em seu célebre ensaio, “Revolução e Contra- Revolução”, que “Deus estabeleceu misteriosas e admiráveis relações entre certas formas, cores, sons, perfumes, sabores, e certos estados de alma”.(1)
Pio XII ensinou: “O homem e todas as suas ações devem manifestar, em louvor e glória do Criador, a infinita perfeição de Deus, e imitá-la tanto quanto possível. Por isto o homem, destinado por sua natureza a alcançar esse fim supremo, deve, no seu agir, conformar-se ao divino arquétipo, e nesta direção orientar todas as faculdades da alma e do corpo, ordenando-as retamente entre si, e devidamente domando-as para o conseguimento do fim.”(2)
Diz o poeta Dante Alighieri (3) que as obras de arte são netas de Deus, pois o homem é filho de Deus e as obras de arte são filhas dos homens. Há nelas, portanto, vestígios do Criador, que importa discernir.
Referências:
1 – Plinio Corrêa de Oliveira, “Revolução e Contra-Revolução”, cap. 10 – 2.
2 – Encíclica Musicae Sacrae Disciplina, de 25-12-55.
3 – ALIGHIERI, Dante. Divina Comédia. Inferno, Canto XI, v.105.
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