Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
13 min — há 4 anos — Atualizado em: 6/16/2020, 12:12:34 AM
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O Comitê Superior da Fraternidade Humana, organização inter-religiosa composta por membros islâmicos, judeus e católicos, convocou para o dia 14 de maio uma jornada [foto acima] “de jejum, obras de misericórdia, orações e súplicas para o bem de toda a humanidade”.1
Durante o Regina Caeli de 3 de maio na Praça de São Pedro, o Papa Francisco declarou: “Como a oração é um valor universal, aceitei a proposta do Comitê Superior da Fraternidade Humana”.
Com base nessa premissa de que “a oração é um valor universal” — independentemente da fé, intenção ou maneira de orar —, o Papa Francisco pediu aos “crentes de todas as religiões” que atendam ao chamado do Comitê Superior e realizem um dia “de oração, jejum. e obras de caridade, para implorar a Deus que ajude a humanidade a superar a pandemia de coronavírus.”
Ao encerrar, o Papa Francisco enfatizou: “Lembre-se: em 14 de maio, todos juntos, crentes de diferentes tradições, orem, jejuem e realizem obras de caridade.”2
“Cada um reze da maneira que sabe e pode, como recebeu de sua cultura”
Durante a missa de 14 de maio, o Papa aderiu à iniciativa.3 Ele enfatizou em seu sermão que, “graças à coragem que este Comitê Superior da Fraternidade Humana demonstrou, fomos convidados a orar juntos, cada um de acordo com própria tradição, e a realizar um dia de penitência, jejum e também caridade, ajudando os outros”.
O próprio Papa Francisco antecipou a pertinente objeção que pode ser feita a essa iniciativa inter-religiosa: “Talvez alguém diga: isso é relativismo religioso e não pode ser feito”. No entanto, ele negou a validade da objeção e a respondeu dizendo: “Mas como não podemos rezar ao pai de todos? Cada um reze da maneira que sabe e como pode, como recebeu de sua própria cultura.”
Afirmar que cada um reza “como sabe”, “como pode”, de acordo com sua “própria cultura”, é aceitar a essência do relativismo religioso, que consiste em rejeitar todas as normas objetivas, bem como a verdade absoluta. Em suma, é cair no completo subjetivismo religioso. Isso é tanto mais assim quando se considera que o Papa se dirige aos “crentes de todas as religiões”, que oram “cada um de acordo com sua própria tradição”.
Deus é o “Pai de todos”?
O Papa Francisco procurou justificar esse relativismo religioso dizendo que Deus é o “Pai de todos”. Assim, não importam as diferenças de crença ou a maneira de rezar, o que implica reconhecer que todas as religiões são igualmente boas e que todas as formas de orar são igualmente louváveis, pois são dirigidas ao mesmo Pai.
Esta afirmação é absurda porque Deus não pode ser o Pai de todos os homens no mesmo modo e no mesmo sentido. Ele não pode ser Pai igualmente dos justos e dos pecadores, dos crentes e dos incrédulos, dos seguidores da verdadeira fé e dos que estão na heresia ou nas trevas do paganismo.
De acordo com o Catecismo do Concílio de Trento, é preciso distinguir entre a paternidade de Deus como “Como criador e governador do mundo” e sua paternidade enquanto adota, pela graça, os cristãos como filhos.4
No primeiro caso — da paternidade de Deus como Criador — há uma analogia em relação a uma pessoa que é pai porque estabeleceu e mantém uma família. Nesse sentido, a paternidade divina pode ser atribuída a todos os homens sem distinção. Entretanto, no segundo caso — da paternidade de Deus, não somente pela criação, mas também por adoção pela graça —, em sentido estrito, Deus só é Pai dos justos, que aceitam a fé em Jesus Cristo e permanecem em Sua amizade.
São João ilustra apropriadamente essa verdade na introdução de seu Evangelho: “[O Verbo Encarnado] veio ao que era seu, mas os seus não O receberam. Mas a todos os que O receberam, deu-lhes o poder de virem a ser filhos de Deus, àqueles que crêem em seu nome” (Jo 1, 11-12) .5
Além disso, São Paulo escreveu aos gálatas: “Todos vós, pois, sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus” (Gl 3, 26). Como também escreveu aos Romanos: “O próprio Espírito atesta ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. Se filhos, também herdeiros, herdeiros de Deus, co-herdeiros de Cristo, suposto que padeçamos com Ele para sermos com Ele glorificados” (Rom 8, 16-17).
Portanto, a filiação divina adotiva vem pela fé e pela graça santificante. O pecado mortal, ao destruir a graça santificante na alma, causa a perda dessa filiação divina adotiva. Mais ainda, o pecador não apenas deixa de ser um filho adotivo de Deus, mas, além disso, se torna filho do diabo, como se lê na Primeira Epístola de São João:
“Quem comete o pecado, esse é do diabo, porque o diabo desde o princípio peca. […] Nisto se conhecem os filhos de Deus e os filhos do diabo. Aquele que não pratica a justiça não é de Deus, e tão pouco aquele que não ama seu irmão” (1 Jo 3, 8-10).
Nosso Senhor ilustrou essa verdade ao responder aos fariseus, que se autodenominavam filhos de Abraão, mas procuravam matá-Lo: “Vós tendes por pai o diabo, e quereis fazer os desejos de vosso pai” (Jo 8,44).
Nem toda oração é igualmente agradável a Deus
O Papa Francisco afirma que “a oração é um valor universal”, o que pode ser entendido no sentido de que todas as orações têm o mesmo valor diante de Deus.
Agora, é evidente que Deus não pode ficar igualmente agradado com a oração do justo e com a do pecador. Nem, do mesmo modo, com a oração daquele que crê na Santíssima Trindade e com a daqueles que não apenas não crêem nela, mas lutam para eliminá-la.6 Ou mesmo com a oração feita através da intercessão de Maria Santíssima, a Mediadora de todas as Graças, e a daquele que rejeita sua mediação.
Santo Tomás ensina que “a oração depende principalmente da fé”, porque “é através da fé que o homem conhece a onipotência e a misericórdia de Deus, que são a fonte pela qual a oração alcança o que pede” .7
A oração é um meio de reverenciar o Criador, como diz o Doutor Angélico: “O homem mostra reverência a Deus por meio da oração, na medida em que se submete a Ele, e orando confessa que precisa dEle como o Autor de seus bens.”8
Mas como pode levar a uma devida “reverência a Deus” religiões que como o Islã, que, se recusa a aceitar a Santíssima Trindade, ou como o Budismo, que rejeita a própria noção de um Deus pessoal?9
Por outro lado, a oração de um pecador só é atendida por Deus quando, pelo que ainda existe de bem em sua alma, ele pede algo útil para a sua salvação. Pelo contrário, quando ele pede algo relativo ao pecado, Deus rejeita sua oração como abominável.10
O mesmo pode ser dito da oração de um não-cristão. Nos momentos em que, iluminado pela graça, ele ora a Deus em procura da verdade, ele será atendido.11 Pelo contrário, quando reza como membro de uma religião falsa, de acordo com seus princípios falsos, e desejando o progresso contínuo de seus erros, Deus não pode atender essa oração sem se contradizer consigo mesmo.
Deus “quer todas as religiões”?
Segundo o Papa Francisco, Deus, em Sua sabedoria, quer a existência de todas as religiões. O Pontífice abraçou essa posição ao assinar o Documento Sobre a Fraternidade Humana em prol da Paz Mundial e da Convivência Comum, em 4 de fevereiro de 2019, em Abu Dhabi [foto acima], com o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyeb. Sua reunião com o prócer muçulmano e a assinatura conjunta do Documento deram origem ao Comitê Superior da Fraternidade Humana, a fonte da iniciativa de oração interreligiosa de 14 de maio. 12
O Documento declara: “O pluralismo e a diversidade de religiões, cor, sexo, raça e linguagem são desejados por Deus em Sua sabedoria, através da qual Ele criou seres humanos.”13
Essa afirmação contraria a razão humana, que se fundamenta no princípio da não-contradição. Assim, Deus em Sua infinita sabedoria jamais poderia querer ser adorado em sua Santíssima Trindade e, ao mesmo tempo, desejar que essa forma de adoração seja considerada idolatria a ser extirpada pelo Islã. Acima de tudo, o falso conceito de Abu Dhabi contradiz a Revelação divina e o Primeiro Mandamento da Lei de Deus: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êx 20, 3).
Devida ao escândalo e às reações desencadeadas pela Declaração de Abu Dhabi,14 mais de um mês depois, em uma audiência geral, o Papa Francisco disse que a existência de muitas religiões é desejada pela “vontade permissiva” de Deus. Depois de perguntar: “Por que Deus permite muitas religiões?” ele respondeu que isso se deve “à voluntas permissiva de Deus”. Ele acrescentou que Deus “queria permitir esta realidade: existem muitas religiões” .15
Faltou-lhe explicar que, embora Deus permita que o mal exista no mundo, “seja para não impedir a existência de bens maiores, seja para evitar que ocorram maiores males”, como diz o Papa Leão XIII,16 Ele não pode ser a causa, nem mesmo indiretamente, de algum mal.17
A explicação do Papa Francisco é ainda mais falha quando ele acrescenta que “algumas (religiões) nascem da cultura, mas sempre olham para o céu; elas olham para Deus.”
A afirmação é muito ambígua, porque as religiões falsas não podem buscar correta e eficazmente o Céu e Deus. Caso contrário, a conclusão necessária seria que todas elas são boas e salvadoras. Se assim fosse, todas existiriam, não pela vontade permissiva de Deus, mas por Sua vontade e desejo positivos. No entanto, esse é o significado da sentença disputada no documento de Abu Dhabi, que causou um grande escândalo por apresentar um Deus contraditório a Si mesmo, querendo o bem e o mal, a verdade e o erro.
Fraternidade utópica
O documento de Abu Dhabi que o Papa Francisco assinou, e a iniciativa de oração do Comitê Superior à qual ele se juntou, pretendem construir uma fraternidade entre os homens abstraindo da fé em Nosso Senhor Jesus Cristo.
Ora, é essa fé que nos torna filhos de Deus e, portanto, verdadeiramente irmãos.
Tal aspiração é, portanto, apenas mais uma das muitas utopias naturalistas das quais a História nos dá tão tristes exemplos.
Uma religião naturalista universal
As idéias que o Papa Francisco prega sobre uma religião universal indefinida não são novas. São Pio X [foto ao lado]já as havia condenado como parte da heresia modernista.
Ao condenar o movimento de inspiração modernista Le Sillon, esse santo Papa denunciou uma verdadeira conspiração dentro da Igreja para transformá-La em uma religião naturalista desprovida de qualquer dogma. Depois de apontar que antes de se desviaresse movimento havia sido objeto de muita esperança, o Pontífice escreve:
“[Le Sillon] agora já não é mais do que um miserável afluente do grande movimento de apostasia organizada, em todos os países, para o estabelecimento de uma Igreja universal que não terá nem dogmas, nem hierarquia, nem regra para o espírito, nem freio para as paixões, e que, sob o pretexto de liberdade e de dignidade humana, restauraria no mundo, se pudesse triunfar, o reino legal da fraude e da violência, e a opressão dos fracos, daqueles que sofrem e que trabalham”.18
Submissão a um poder alheio a Jesus Cristo
Além dos aspectos teológicos perturbadores das várias declarações e iniciativas discutidas acima, desconcerta como o Papa Francisco, detentor por instituição divina da mais alta autoridade religiosa da Terra, de alguma forma se submeteu a outro poder religioso financiado e dominado por muçulmanos.
Um exemplo da perplexidade que causou essa atitude é a carta de um sacerdote ao jornalista católico Aldo Maria Vali, que a publicou em seu blog. O jovem padre escreve: “Fiquei subitamente chocado com o tipo de obediência do Papa a uma autoridade que ele parece considerar superior à sua, cujo nome é todo um programa: Comitê Superior da Fraternidade Humana”.19
Estaria Francisco com esse gesto abdicando implicitamente do papado? Embora a pergunta seja delicada, ela não pode deixar de ocorrer a muitos, principalmente porque há pouco ele renunciou ao uso do título papal de “Vigário de Cristo”.20
Rezemos para que a luz brilhe em meio a tanta confusão. Que Maria Santíssima, Sede da Sabedoria, nos guie nesta situação e nos ajude a permanecer fiéis à única e verdadeira Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
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