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26 min — há 9 anos — Atualizado em: 8/23/2018, 8:47:25 PM
A febre de desapropriações de terras pelo governo do PT não cessa: ele faz aparecer, ora novas tribos indígenas, ora falsos quilombolas, ora assentamentos de Reforma Agrária, ora unidades de conservação ambiental em terras trabalhadas por pioneiros brasileiros há mais de 100 anos.
Com o Amapá, Roraima — até então território — tornou-se unidade da federação em 1988. Com área de 224.298,98 km², pouco menor que o estado de São Paulo, o novo estado faz parte da Amazônia Legal. Situa-se no extremo norte do Brasil, com 95% de suas terras acima da linha do equador, limitando com a Venezuela e a República da Guiana. Aliás, é lá que se encontra o Monte Caburaí, ponto extremo do Brasil setentrional. Não dizemos mais “do Oiapoque ao Chuí”, mas do “Caburaí ao Chuí”. A população total de Roraima ainda não atinge 450 mil habitantes.
Praticamente 50% de seus 22.429,898 hectares estão ocupados por reservas indígenas! Um naco de 14,42% está transformado em unidades de conservação do estado e dos municípios, além de mais 7,24% destinados a unidades de conservação federais. Há ainda um pequeno percentual reservado às áreas militares. Do restante, devem ser excluídas as áreas de Reserva Legal, 35% das áreas de lavrado e 80% das áreas de mata, mais 11% da área remanescente para preservação permanente. Mais os leitos de seus numerosos rios, igarapés e estradas…
O leitor, por certo, já se deu conta que restou pouco espaço para a agricultura e a pecuária. Ademais, a situação fundiária do estado está à mercê das políticas federais levadas a cabo pelo INCRA, IBAMA e FUNAI. O tridente do Governo Federal, segundo Paulo César Quartiero, arrozeiro expulso da Raposa/Serra do Sol e hoje vice-governador do estado. De tão engessado, Roraima ficou sem meios para se desenvolver. Exemplo elucidativo disso é a estagnação de sua pecuária. De 1980 para esta parte, seu rebanho bovino se encontra estagnado, com cerca de 400 mil cabeças.
Para tornar realidade o Decreto 6.754, de 2009 — durante o governo Lula da Silva, que transferiu “gratuitamente” as terras da União Federal para o estado de Roraima, estabeleceu-se como condição a criação do Parque Nacional do Lavrado —, o IBAMA vem agindo para expulsar 132 famílias que há mais de cem anos
exploram a pecuária na região da Serra da Lua. Embora Roraima tenha 3.900.000 hectares de lavrado, 2.200.000 hectares já foram transformados em áreas protegidas.
Nossos correspondentes Paulo Henrique Chaves e Nelson Ramos Barretto, que em 2008 já haviam estado na Serra do Sol, acabam de regressar de Roraima. Eles estiveram agora na região da Serra da Lua, no município de Bonfim, fronteira com a ex-Guiana inglesa, no extremo norte de nosso país-continente, onde entrevistaram in loco descendentes dos seus desbravadores, hoje ameaçados de expulsão de suas terras para dar lugar a mais um parque ecológico.
Catolicismo apresenta em primeira mão o depoimento dramático do Sr. Alceu Thomé. Típico descendente de desbravadores, ele continua aos 79 anos trabalhando na terra. Com a tez queimada pelo sol equatorial, demonstra a sua têmpera de homem corajoso que criou 12 filhos, mas que se comove às lágrimas ao relatar a injustiça que o atual governo socialista está prestes a cometer contra ele e outros produtores rurais. Uma de suas filhas é veterinária, Dra. Cristiane Thomé, e participante ativa da Associação dos Moradores e Produtores Rurais da região da Serra da Lua desde o desencadeamento das tentativas de expulsão.
Enquanto os governos militares mantiveram na Amazônia a política de “ocupar para integrar”, os posteriores, pautados por uma perversa política ideológica, atuam em direção diametralmente oposta, ou seja, de retirar aqueles que há décadas viviam e ainda vivem lá, bem como os que se integraram à região a partir das décadas de 1970 e 1980, hoje qualificados de “intrusos”. Para o atual governo, eles devem deixar aquelas vastas regiões de fronteiras vazias, que devem ser transformadas em reservas e parques ecológicos — aliás com muito poucos índios assistidos por numerosas ONGs.
Tanto isso é verdade que o ex-comandante militar da Amazônia, General Augusto Heleno Ribeiro Pereira, chegou a declarar ser muito difícil entender a razão de existirem pouquíssimas ONGs se dedicando a socorrer a população nordestina, enquanto centenas de outras trabalham junto às populações indígenas. Para aquele graduado militar, muitas delas investem milhões de dólares na região e não se trata de uma questão de governo, mas de uma questão de Estado que afeta a nossa soberania.
A esse propósito, não faltou judiciosa advertência. Quando da elaboração da Constituição vigente, em 1987, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira denunciou: “O Projeto de Constituição, ao adotar uma concepção tão hipertrofiada dos direitos dos índios, abre caminho a que se venha a reconhecer aos vários agrupamentos indígenas uma como que soberania diminutae rationis. Uma autodeterminação, segundo a expressão consagrada”. Com efeito, declarações de expressivos líderes mundiais demonstram a cobiça internacional por nossa Amazônia. Se não, vejamos.
Afirmações preocupantes aparecem no Relatório da Comissão da Câmara dos Deputados de 2004. Entre outras, citamos: Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos, em 1989: “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”. François Mitterrand, ex-presidente da França: “O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia”. Mikhail Gorbachev, ex-presidente da Rússia, em 1992: “O Brasil deve delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes”.
* * *
Catolicismo—O senhor nasceu aqui mesmo?
Sr. Alceu —Nasci num lugar vizinho a este. A terra era dividida em 12 glebas e essa aqui era uma parte. O lugar onde eu nasci era outra parte. O total eram 97 mil hectares com título de 1904, do estado do Amazonas.
Catolicismo— O senhor foi educado aqui ao lado?
Sr. Alceu — Quando criança, com os meus pais, morava com o meu avô que era vaqueiro do Cel. Pinto, proprietário da área. Depois de ele trabalhar muitos anos, adquiriu alguma coisa, requereu uma terra lá do outro lado do rio Urubu. Meu pai me criou lá trabalhando. Aos nove anos perdi a minha mãe. Eu tinha mais três irmãos pequenos. Como já havia aqui uns meninos órfãos de mãe, duas de minhas tias que eram solteiras passaram a cuidar de nós até certa idade.
Catolicismo— O seu avô era o Joaquim Thomé?
Sr. Alceu — Era o Joaquim Thomé. Fui criado dentro dessa casa com eles. Mas aqui eu percorria a região toda, trabalhava com todos os meus tios; com meu pai, onde fosse preciso, a gente trabalhava, era tudo junto, pois a família era muito unida. Conheço tudo por aqui. Depois que me casei, meu pai comprou um terreno e me colocou para trabalhar como vaqueiro dele. Aí eu trabalhei para ir ganhando alguma coisa. Mais tarde comprei esta área onde eu moro.
Catolicismo— E como foi a sua criação aqui nessas terras?
Sr. Alceu — Fui criado como filho de peão e nunca me sentei em banco de escola, porque naquele tempo não existia escola por aqui. Também não existia malandro como existe hoje, o povo trabalhava com vontade de vencer na vida. Aos oito anos eu montava a cavalo, saindo de manhã e voltando à tarde, à noite ou à hora que fosse preciso. Eu pegava no machado, na enxada, tudo isso eu sei fazer. Montava em cavalo bravo, enfrentava boi bravo, tudo o que fosse preciso aqui na terra. Para eu adquirir alguma coisa não foi fácil. Suei muito, sofri muito, e sofro até hoje. Ainda agora, no final da semana passada, eu e um filho saímos a cavalo às 10 horas da manhã, aguentamos o sol do meio dia, para revistar e olhar o gado. Só regressamos às quatro da tarde. Nessas ocasiões, enfrentamos sol quente, noite, chuva, o que for preciso. Olhem meu rosto, minha pele é queimada pelo sol, e não é de Copacabana não. É o sol dos lavrados de Roraima.
Catolicismo— O senhor começou com quantos hectares?
Sr. Alceu — Eu comprei esse terreno com 3.102 hectares.
Catolicismo— Quantos filhos e netos o senhor tem?
Sr. Alceu — Meus filhos, graças a Deus, estão todos vivos e são 12. O que eu tenho para deixar para eles é esta propriedade. Netos são 16 ou 17.
Catolicismo— A terra do seu pai ficou para quem?
Sr. Alceu — Nós éramos oito irmãos e aterra foi dividida para os filhos e tocou um pedacinho para mim.
Catolicismo— E os senhores tiveram alguma assistência do Estado?
Sr. Alceu — Ajuda que a gente teve e tem são essas estradas que vocês passaram… [Estradas de chão esburacadas e com travessias em valas e riachos sem pontes]. Nada mais.
Catolicismo— Que gado o senhor cria lá?
Sr. Alceu — Eu crio o mestição. Gado de cria, pois no lavrado não temos condições de engorda, é para criar; os bezerros vão crescendo e eu vou vendendo.
Catolicismo— O senhor vende com que idade?
Sr. Alceu — Com dois anos aproximadamente, depende da necessidade. Na hora que a necessidade aperta, então tenho que vender na idade que estiver. Eu vou segurando, mas quando a necessidade me obriga, eu vendo.
Catolicismo— As pastagens do lavrado são naturais?
Sr. Alceu — Até hoje é tudo campo natural. Desde o tempo do Cel. Pinto. A gente vinha para a cidade só quando tinha muita necessidade. Mandávamos boi para o Amazonas. O gado ia tocado.
Catolicismo—Quem preparava a comida?
Sr. Alceu — Ia um peão para isso. Não dava tempo de fazer a paçoca; assava a carne na brasa, cortava bem miúdo, punha num saquinho que a gente carregava na garupa do cavalo, e na hora da fome ia comendo carne com farinha e bebendo água.
Catolicismo— Conte um pouco como o senhor educou os seus filhos.
Sr. Alceu — Na medida em que fui trabalhando, comprei uma casa em Boa Vista, trouxe a mãe deles para cá com eles, botei-os aqui pra estudar. Aquilo que eu não tive eu dei para os meus filhos, e assim criei e eduquei meus filhos com o que adquiri trabalhando.
Catolicismo— Pelo visto o senhor continua trabalhando?
Sr. Alceu — Sim. Com meus 79 anos, eu amanheço e anoiteço agarrado no que é meu, lutando para conservar o que eu adquiri na minha vida e que foi muito sofrido para mim. Fiz e faço o que aprendi com meu pai. Estou passando para os meus filhos. Eles, por sua vez, estão passando para os netos. E já tenho bisnetos. Aquele garotinho ali é bisneto. E ele já bota sela no cavalo e sai trotando comigo para ajuntar o gado no sol quente.
Catolicismo— Então o senhor toda a vida se dedicou à criação de gado?
Sr. Alceu — Trabalhei a vida toda com criação de gado. Conto a história que os velhos me contaram. Quem chegou primeiro aqui foi o Sebastião Diniz. Ele requereu essas terras, demarcou e pôs 18 mil cabeças de gado, fez a sede da fazenda, onde ainda hoje mora um primo meu que está com noventa e tantos anos. Foi ele quem trouxe meu avô, que era português, para cá. Meu avô era quem cuidava de tudo. Quando o meu avô conseguiu alguma coisa, requereu umas terras e as entregou ao meu pai. Foi então que eu passei a trabalhar com meu pai como vaqueiro, e, mais tarde, comprei este lugar aqui.
Catolicismo— Foram feitas benfeitorias aqui ao longo das gerações?
Sr. Alceu — Escolas, posto de saúde, nunca houve por aqui. Tanto que eu fui criado desse jeito. Costumo dizer às pessoas que vão a minha casa que desejaria recebê-las com educação, mas nem educado eu sou! Certa vez fui repreendido por uma senhora. — Que é isso Alceu? O senhor tem educação para conversar com qualquer pessoa! Respondi a ela que eu não frequentei escola. Estudo mesmo eu não tive. O que eu aprendi foi com as minhas tias, que nos acolheram quando eu e meus irmãos perdemos a mãe. Elas também sabiam muito pouco, mas o que sabiam, elas me ensinaram.
Catolicismo— O senhor nem chegou a fazer o curso primário?
Sr. Alceu — Só aprendi a ler e escrever e fazer contas com minhas tias. Acabou que aqui virou uma espécie de creche, pois além de mim e mais três irmãos, havia mais quatro primos, também órfãos de mãe, filhos do meu tio Olavo. Depois outra tia acabou morrendo e deixando mais cinco filhos, que também vieram para cá. Então virou uma creche. Todos nós ajudávamos o Pedro Lima, que trabalhava aqui no campo e no curral, e assim a gente ia aprendendo. Quando meu pai achou que eu estava maduro para a vida, ele entregou tudo para eu cuidar e tomar conta para ele. Fui criado naquele movimento junto com ele, aprendi a fazer tudo aquilo que eles faziam.
Catolicismo— O senhor já é da terceira geração que passou para a quarta, quinta, e agora está surgindo a sexta geração, não é verdade?
Sr. Alceu — Já chegamos à sexta geração com os meus bisnetos.
Catolicismo— Em meio a tanta dificuldade naqueles tempos, não havia algumas festas?
Sr. Alceu — Ah! De vezem quando a gente se reunia numa fazenda por aqui. Reunia o povo daqui, vinha a cavalo, de carro de boi, de bicicleta. Um ia avisando o outro e no dia da festa todos se reuniam, assava-se carne, fazia-se o churrasco, muita cachaça e dança de forró. Tinha muito sanfoneiro por aqui, até eu fui sanfoneiro. Tinha uma sanfoninha de oito baixos, mas cheguei a tocar numa de 80 baixos. Eu ainda tenho uma lá em casa, está guardadinha. O povo sabia se divertir. Naquele tempo não existiam essas leis de tomar as terras da gente não, por isso que as pessoas trabalhavam alegres e com gosto. Hoje ninguém tem mais gosto de fazer nada, as pessoas não têm mais segurança e ficam desanimadas, desesperadas, nem investem mais.
Catolicismo— Nessas condições, ou seja, nascido e criado aqui, formando sua família passando toda a vida aqui, como o senhor se sente diante desta ameaça de sua iminente saída? O senhor vai fazer o quê?
Sr. Alceu — Claro que eu não fico nem um pouco satisfeito. Eu fico pensando que eu trabalhei a minha vida toda. Eu tenho 12 filhos, estou no fim da minha vida, mas o que eu tenho para deixar para eles é isso aí. Então o cidadão vem aí, toma tudo, eu vou embora e meus filhos ficam aí sem nada. Tudo o que eu construí vai tudo para as nuvens. Em vez de ficar para os meus filhos, outros é que vão levar. Isso não é justo. Deus sabe que isso não é justo.
Catolicismo— A Dra. Cristiane poderia nos falar sobre este processo de criação do Parque Nacional do Lavrado na Serra da Lua, justamente nesta região que conta com mais de 150 proprietários dedicando-se à pecuária e em franca atividade?
Dra. Cristiane— Este acontecimento nos pegou de surpresa. Nós sempre vivemos aqui, moramos aqui, meu antepassados são todos daqui, eles estão aqui há mais de 100 anos. Na verdade, desde que Roraima deixou de ser território para se tornar Estado em 1988, a questão fundiária nunca foi definida, o que vem motivando muitos conflitos e mesmo traumas, como ocorreu há pouco tempo com a expulsão não apenas de seis arrozeiros, mas de cerca de 400 proprietários estabelecidos na Raposa/Serra do Sol, para a criação de mais uma reserva indígena. Quando achávamos que as pretensões dos protagonistas do engessamento de nosso estado haviam cessado, eis que nos deparamos com a nova pretensão do Governo Federal, através de seus órgãos como a FUNAI e o IBAMA, de transformar esta região produtiva num reserva ecológica, o Parque Nacional do Lavrado.
Catolicismo— Isso surgiu por meio de um decreto?
Dra. Cristiane— Foi isso. Veio através de um de um decreto que pretende apoiar-se num estudo não condizente com a nossa realidade. Os moradores tomaram conhecimento deste decreto através de jornais daqui, que já foram noticiando que os produtores da região da Serra da Lua teriam de deixar suas terras para a criação do tal parque. Sequer fomos avisados de que as nossas propriedades estavam sendo objeto de estudos para fins de desapropriação. Com efeito, recebemos visitas de pessoas em nossas casas que se diziam interessadas em conhecer a região, a gente as tratava bem, e quando nos demos conta, eles estavam fazendo laudos para nos retirar daqui, laudos estes não condizentes com a realidade.
Catolicismo— Existe uma cláusula do decreto que trata da obrigatoriedade de se consultar antes o Estado. Na única audiência pública votou-se pela rejeição. E os proprietários não foram consultados?
Dra. Cristiane— Nós, como produtores, em momento algum desse levantamento fomos consultados. Nem tínhamos ideia sobre a criação deste Parque Nacional do Lavrado. E o que mais nos deixa inconformados é que eles utilizaram a máquina do Governo Federal e da Prefeitura de Boa Vista. O decreto indica ser necessário consultar o Estado e vê-se que este laudo, este estudo não está de acordo com o que diz o decreto.
Catolicismo— Teria sido feito de encomenda?
Dra. Cristiane— Creio que sim. E com o apoio de ONGs, com apoios de funcionários públicos que mais parecem atender a interesses internacionais e não aos nossos; nós trabalhamos aqui, pagamos imposto para depois se tornar salário desses funcionários que vêm aqui ganhando bons salários, sendo acolhidos em nossas casas, comendo em nossas mesas e colhendo informações nossas a fim de nos prejudicar, de nos deixar preocupados. De um tempo a esta parte, ninguém daqui sabe o que acontecerá no dia seguinte. Temos de gastar nosso tempo e dinheiro para tentar nos defender em detrimento de nossas atividades rotineiras aqui nas fazendas.
Catolicismo— Pelo que sabemos, a maior área de lavrado de Roraima não fica exatamente nas reservas indígenas já demarcadas?
Dra. Cristiane— Quando foi demarcada a região da Raposa/Serra do Sol para reserva indígena, um dos pretextos que deram à época foi o da necessidade de conservação da área, já que o índio conservaria a natureza. Conservação ambiental, pois as savanas, os lavrados, como dizemos aqui em Roraima, propriamente ditos, ficam dentro das reservas indígenas.
Catolicismo— Aqui na região nunca houve floresta amazônica?
Dra. Cristiane— Não. 17% do Estado são constituídos de lavrado, que é constituído de savana, uma vegetação rala que serve de pastagem natural dentro do bioma amazônico. Na região do lavrado nunca houve matas.
Catolicismo— E nesses mais de 100 anos de ocupação, a região vem sendo conservada?
Dra. Cristiane— Eu posso garantir que dentro da Serra da Lua, a prova concreta de que nós sabemos lidar com a pecuária e sustentar nossas famílias, dar empregos, gerar renda, a prova concreta está lá, não há capim plantado, pois as pastagens são todas de capim natural de lá, portanto o meio-ambiente está totalmente preservado.
Catolicismo— A produção da área atende que mercado? Apenas o de Roraima?
Dra. Cristiane— Nosso gado abastece tanto a capital, Boa Vista, como atende o Estado do Amazonas, sobretudo Manaus, que já conta com mais de dois milhões de habitantes.
Catolicismo— Que atitude vocês têm tomado em relação a este decreto, da época do presidente Lula?
Dra. Cristiane — Desde quando a gente soube dessa trapaça contra nós, dessa injustiça, eu chamo assim, a gente criou uma Associação dos produtores da região. Fizemos o levantamento de todas as propriedades existentes ali na Serra da Lua, promovemos reuniões, já ouvimos opiniões de vários políticos, do Senador Romero Jucá, sempre na esperança de que eles resolvam este problema criado contra nós e contra o estado de Roraima. Tudo o que a gente espera da classe política é que ela atenda os habitantes de Roraima. Eles são deputados, senadores, governadores, fomos nós que os colocamos lá, então eles têm obrigação de defender os interesses do povo daqui; do povo que trabalha, do povo que construiu este estado, do povo que tem uma história aqui dentro.
Catolicismo— Hoje haverá em Brasília uma reunião de governadores com a presidente Dilma. A governadora Suely Campos já tratou ou vai tratar dessa questão de vocês com a presidente?
Dra. Cristiane— A governadora vem se posicionando para que não se faça o Parque da Reserva do Lavrado em área produtiva, portanto não concorda com a nossa saída da região da Serra da Lua. Estamos lá 111 anos, temos toda documentação, e trabalhando. Os senhores viram e puderam constatar que estamos na 6ª geração da mesma família, trabalhando no mesmo lugar e seguindo a mesma tradição de nossos antepassados. Estamos a pique de não aguentar mais este estado de tensão, de sermos despejados de nossas casas, de nossos lares, de perdermos todas as raízes que a nossa família foi deitando nesta terra ao longo das décadas enfrentando muitas adversidades. Não faz muito tempo, o único meio de transporte que havia para se ir a Boa Vista era o carro de boi. Gastava-se de três a quatro dias para chegar lá… A vida rural no norte do Brasil é diferente do sul e do sudeste. Aqui a única fonte de renda é a que provém da propriedade rural. É o nosso sustento, pois não existe indústria, não há fábrica. Nosso sustento vem todo da propriedade rural. A gente precisa dessa terra, precisa trabalhar, precisa pagar os impostos e colaborar com o governo. Ou o governo não quer desenvolvimento? Estamos aqui para ajudar, mas precisamos ter as condições mínimas para isso.
Catolicismo— O que aconteceu no estado depois da demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol, que também expulsou mais de 300 famílias lá radicadas havia décadas?
Dra. Cristiane— Isso foi horrível! Muitos produtores rurais que dependiam da sua terra, do seu alimento, ficaram sem aquilo e tiveram que se readaptar em outro local. Tiveram de abandonar tudo, aquela tradição que eles tinham herdado que era a criação do gado, seu berço agrário. Alguns que saíram de lá se estabeleceram aqui na região da Serra da Lua para dar continuidade às suas atividades primárias. E agora, a Serra da Lua é ameaçada com a criação deste Parque Ecológico do Lavrado. Suponho que isso não vai parar aqui na Serra da Lua. Qualquer área de Roraima estará sujeita a desapropriações desse tipo para mais e mais reservas. E olhe que Roraima possui área que corresponde quase à do estado de São Paulo. São 22.429.898 hectares. Sabe quanto resta de terras aqui que podem ser exploradas para a agricultura e pecuária? Não atingem 900.000 hectares… Ou seja, o estado está completamente engessado, sem nenhuma chance de se desenvolver.
Catolicismo— Qual teria sido a causa da demarcação desse Parque Nacional da Reserva do Lavrado aqui na Serra da Lua?
Dra. Cristiane— Nós jácogitamos muito sobre isto. Por que se pega um estado da Federação e o compromete todo com área indígena ou área ambiental? O Estado brasileiro não pode ficar com 100% de reservas! Sobretudo, no caso da Federação, um Estado como o nosso, com pouco acesso aos centros mais desenvolvidos do Brasil em razão de nossa posição geográfica. Seus habitantes vão ser eternamente tutelados pela União? Como já disse, aqui não temos indústrias, o comércio é limitado, não há senão terras a serem racionalmente cultivadas. O estado de Roraima nunca poderá contar com a força de seus habitantes? Seremos eternamente parasitas vivendo na capital, do dinheiro dos impostos dos brasileiros do sul e do sudeste? Roraima possui reservas de ouro, reservas de nióbio, a Bacia do Tacutu está aqui dentro.
Catolicismo— Portanto, o seu subsolo é muito rico?
Dra. Cristiane— Uma coisa que gostaria de deixar claro é que, quando saiu este decreto para a criação do Parque do Lavrado, muitos proprietários daqui viram aviões sobrevoando, realizando rasantes; aquilo só poderia ser para pesquisas. Apenas nós, moradores aqui, não ficamos sabendo do que se tratava. E quando vamos procurar informações sobre isso, elas nos são negadas. Para nós é claro que existe muita riqueza aqui no subsolo, muito minério. Alguma coisa está despertando interesse por aqui. Não é possível os índios vão ficar com quase todo o estado de Roraima; e o que eles não usarem se torne ambiental! E eu? Por acaso não sou humana? Não tenho um espaço sob o sol neste mundo?
Catolicismo— Costumamos sugerir às pessoas em situação semelhante à de vocês, a reagirem em três frentes: no campo jurídico, no político e na opinião pública.
Dra. Cristiane— Sim. E existe outro, que julgo mais importante ainda: é ter fé em Deus e nas orações. Foi Deus quem me fez conhecer o Príncipe Dom Bertrand, a razão de os senhores estarem aqui.
Catolicismo— Então vamos suplicar a Nossa Senhora Aparecida, para que Ela os proteja especialmente e livre o Brasil dessas leis iníquas e do regime comunista.
Comandante do Exército alerta sobre a soberania da Amazônia
Confirmação das sérias advertências de Catolicismo
O comandante do Exército, general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado Federal, alertou para os riscos de enfraquecimento da soberania do Brasil sobre a parte nacional da Amazônia. Contraditado pelos senadores, ele esclareceu que não se referia a ameaças à integridade territorial, mas a situações que limitam a autoridade do País sobre decisões estratégicas para o desenvolvimento equilibrado da região, buscando atender aos interesses do Brasil e, principalmente, da população dos estados amazônicos.
— Isso se caracteriza muito bem como os ‘déficits de soberania’ que nós estamos admitindo dentro da Amazônia — conceituou.
Corredor ecológico
O comandante citou como exemplo de iniciativa capaz de comprometer a autoridade do País a recente proposta do presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, ao Congresso de seu país. Segundo ele, Santos sugeriu a criação de um corredor ecológico na Amazônia continental, do Andes até o Oceano Atlântico, compreendendo a Amazônia brasileira. O objetivo é levar a ideia — chamada ‘tríplice way’ — para análise da próxima reunião da Conferência de Mudanças Climáticas (CoP 21), em Paris.
Riquezas intocadas
De acordo com o general, a intenção é manter toda a extensão do corredor intocado, sem exploração de suas riquezas, como contribuição para deter as mudanças climáticas. Pelo projeto, esse corredor seria implantado em até cinco anos. Antes, registrou que a Amazônia se estende por 830 mil quilômetros quadrados, em área de nove países, inclusive o Brasil (com 62% de todo o território). As riquezas são estimadas em mais de US$ 230 trilhões, com reservas de minérios raros e rica biodiversidade.
O comandante informou que a proposta de criação do corredor tem origem na Fundação Gaia, organização não-governamental instalada na Colômbia e vinculada à entidade Gaia Internacional, a provedora dos recursos para os estudos. Disse que a ideia fundamental é a de que os recursos naturais da Amazônia devem ficar congelados para sempre. Ao contrário disso, ele defendeu ao longo da exposição que é possível conciliar a preservação e o uso racional das riquezas na região.
— Esse processo [radicalismo pela preservação] é como combater fantasmas, que a gente não sabe de onde vêm, quem são, o que fazem e quais são seus reais objetivos — comentou.
O general Villas Bôas foi convidado para audiência em decorrência de requerimento apresentado pelo senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que também presidiu os trabalhos. O objetivo foi debater as questões da Amazônia, como a situação do controle das fronteiras, ameaças do tráfico de drogas e armas, além do nível de coordenação com as forças militares dos países limítrofes.
Reservas indígenas
O comandante do Exército fez também restrições ao modelo de reservas indígenas, concentradas sobretudo na Amazônia. Julgou questionável a “coincidência” do estabelecimento de reservas em áreas com forte concentração de riquezas minerais, o que procurou demonstrar com a apresentação de mapas das reservas indígenas e de jazidas minerais já identificadas.
— Não sou contra unidades de conservação em terras indígenas. Ao contrário, temos que ter desmatamento zero, temos que proteger nossos indígenas, mas temos que compatibilizar esse objetivo com a exploração dos recursos naturais — defendeu.
Sem projetos para que a exploração das riquezas seja feita de modo equilibrado, sob controle e fiscalização, o general disse que tudo passa a acontecer clandestinamente. Como exemplo, citou os veios de diamantes cor-de-rosa nas terras indígenas Roosevelt, em Rondônia. Disse que os diamantes continuam sendo extraídos e saindo ilicitamente do Brasil.
— Isso é uma hemorragia; são riquezas que o País perde, que saem pelas estruturas de contrabando, e o País não se beneficia em nada com isso — criticou”. (Fonte: “Agência Senado”, 16-7-15).
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