Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
9 min — há 6 anos
Pelas ruas da pequena cidade de Le Mure, perto de Grénoble (França), apareceu um modesto amolador de facas. Trazia pela mão uma menina de uns cinco anos de idade, pobremente vestida. Enquanto o pai amolava as facas, a pequena ia batendo de porta em porta, pedindo trabalho para ele.
O ar de inocência da criança e a maneira educada como falava, logo atraíram o interesse geral. Quem era ela? De onde vinham? E a mãe? Eram algumas perguntas que lhe faziam.
A menina, embora precocemente amadurecida pelas vicissitudes da vida, pôde dizer pouca coisa: seu pai chamava-se Julião Eymard; a mãe havia falecido havia pouco; dos seus cinco irmãos, os três mais velhos tinham saído de casa à procura de emprego; os dois mais novos foram deixados em casa de parentes; só ela tinha ficado para ajudar o pai em seu trabalho.
Marianinha, como se chamava, poderia ter acrescentado que Julião tinha sido um agricultor com certa fartura, antes de irromper a diabólica Revolução Francesa contra o Altar e o Trono. Como autêntico católico, fora perseguido, tivera que andar foragido e perdera tudo o que tinha. Com a morte da esposa, foi preciso dispersar a família e começar esse modesto trabalho de amolador para sobreviver.
O calor e simpatia que encontrou em Le Mure levou-o a nela radicar-se. Aos poucos abriu um negócio de funileiro, e mais tarde montou um lagar para extrair óleo de nozes, tudo muito rústico, mas que dava o suficiente para viver.
A conselho do confessor, Julião contraiu novo matrimônio, com Maria Madalena Pelorse. E novos filhos foram vindo. Mas a esse convicto católico, Deus Nosso Senhor reservara sua Cruz: em menos de cinco anos, ele perdeu sete filhos, alguns de pouca idade.
Seria uma compensação o nascimento de Pedro Julião, em 4 de fevereiro de 1811? Numa família virtuosa, o menino desde cedo sentiu-se atraído para as coisas da Religião. Sua mãe, que assistia à Missa diariamente, começou a levá-lo com ela, como também às visitas diárias que fazia ao Santíssimo Sacramento. E o menino se mostrava muito comportado nesses atos.
Em Le Mure havia o piedoso costume de dar a bênção do Santíssimo Sacramento na intenção dos agonizantes. Maria Madalena levava então o filho ainda bebê à igreja e o erguia na hora da bênção suplicando ao Senhor que o abençoasse.
Quando mais crescido, nas sextas-feiras a mãe fazia-o dormir sobre palha, em vez de pô-lo a dormir no berço, em louvor da paixão de Nosso Senhor e para acostumá-lo a alguma mortificação.
Com o falecimento da mãe, coube à irmã acabar de criá-lo. Certo dia o menino, então com cinco anos, desapareceu. A irmã, depois de procurá-lo em vão por toda parte, teve a inspiração de ir à igreja. Quando olhou por detrás do altar, viu-o sentado quietinho na escada utilizada para colocar o Santíssimo Sacramento para exposição, o rostinho encostado no sacrário.
— O que você faz aqui? –– perguntou-lhe intrigada.
— A minha oração –– respondeu o menino.
— Mas, por que aí?
— Porque aqui estou perto de Jesus, e o ouço melhor.
Mais tarde, já adolescente, Pedro Julião passou a entregar o óleo preparado pelo pai na casa dos fregueses. Mas era tanta sua atração pelo Santíssimo Sacramento que, passando pela igreja paroquial, entrava sempre para fazer-lhe uma visita.
Antes de sua Primeira Comunhão, quando a irmã comungava, pedia-lhe que ficasse bem junto dele, para sentir a presença de Nosso Senhor na alma dela.
Foi com muita dificuldade que Pedro Julião obteve licença do pai para entrar no seminário e, depois de muitos percalços, ser ordenado sacerdote.
O caminho da Divina Providência, que dele queria fazer o apóstolo da devoção eucarística, passou por vários meandros. Sentia em si vocação religiosa, e acabou entrando para a Congregação dos Oblatos de Maria Imaculada, de fundação recente, que além da educação da juventude, dedicava-se também às missões rurais e acabava de mandar os primeiros missionários para a Oceania. Nessa congregação foi exercendo várias funções, mas não deixava de cuidar dos pobres e doentes, de maneira que passou a ser conhecido por eles como “o Santo”.
Um dia, em Lião, durante a revolução anarquista de 1848, o Pe. Eymard passava por uma das ruas da cidade quando deparou-se com um grupo de revolucionários.
— O quê?! Um padre por aqui? –– gritaram alguns.
––O padre ao Ródano! –– gritaram em coro vários deles, ameaçando jogá-lo ao rio, e avançaram para agarrá-lo.
Nesse momento um dos revolucionários gritou:
–– Mas é o Pe. Eymard!
A este nome todos pararam em silêncio, e depois gritaram:
–– Viva o Pe. Eymard!
E o puseram nos ombros, levando-o em triunfo até o convento.
Em sua primeira viagem a Paris, o Pe. Eymard tomou contacto com a Adoração Perpétua e conheceu um judeu convertido, Ermano Cohen, que iniciara a adoração noturna dos homens. Nos meios eucarísticos, conheceu também um capitão de fragata, Conde Raimundo de Cuers, que depois seria seu auxiliar na nova congregação dos Sacramentinos.
Um dia o Pe. Eymard orava na basílica de Fourvière, diante do altar de Nossa Senhora. Assim descreve inspiração que lhe veio ao espírito nessa ocasião: “Estava rezando, quando se apoderou de mim um pensamento tão forte, que me absorveu a ponto de perder completamente todo outro sentimento: para glorificar seu Mistério de Amor, Jesus, no Santíssimo Sacramento, não tinha um corpo religioso que fizesse disso sua finalidade e a isso dedicasse todos os seus cuidados. Era necessário que houvesse um”. E quem tinha a graça para fazê-lo era ele próprio.
Quanto lhe custou para levar essa obra avante! Religioso, com os três votos, não era livre para dedicar-se inteiramente à obra que a Providência lhe pedia. E o superior geral dos Oblatos de Maria Imaculada não queria dispensá-lo dos votos, para não perder um tão útil elemento para sua congregação.
Pe. Eymard consultou o próprio Papa Pio IX sobre a possível futura congregação. Respondeu o imortal Pontífice: “A obra vem de Deus, estamos convencidos. A Igreja necessita disto: que se sigam todos os caminhos para tornar conhecida a divina Eucaristia”.
Finalmente o Pe. Eymard conseguiu dispensa dos votos. Com o Conde de Cuers, a essa altura ordenado sacerdote, deu início à Congregação do Santíssimo Sacramento. Ao arcebispo de Paris, que daria autorização para a nova congregação, explicou que “a nossa não é uma congregação puramente contemplativa. Nós fazemos a adoração, é certo. Mas queremos também levar outros a serem adoradores, e devemos nos ocupar das Primeiras Comunhões tardias. Enfim, queremos pôr fogo nos quatro cantos de Paris, que tanto necessita”. Entretanto, a vocação do verdadeiro adorador do Santíssimo Sacramento era, segundo ele mesmo, mais ampla: “Adorar perpetuamente Nosso Senhor no trono da graça e de amor, agradecer-lhe pelo inefável benefício da Eucaristia, tornar-se uma mesma vítima com Jesus Hóstia para reparação de tantos pecados que cobrem a Terra, exercer aos pés da Eucaristia uma missão perene de ação de graças e impetração pela Igreja, pela paz entre os príncipes cristãos, pela conversão dos pecadores, dos hereges, dos infiéis, dos judeus: eis o elemento perene da vida do religioso do Santíssimo Sacramento”.
E para sua concretização tinha se dedicado inteiramente: “Disse sim a tudo e fiz voto de dedicar-me até a morte à fundação de uma congregação de adoradores. Prometi a Deus que nada me deteria, devesse eu embora comer pedras e acabar no hospital. E, principalmente, pedi a Deus (e talvez fosse isto presunção de minha parte) trabalhar sem o menor conforto humano”.
Assim, no dia 22 de maio de 1856, dia de Corpus Christi, foi inaugurado o primeiro “cenáculo”, nome típico que o santo daria a todas as casas do Instituto. Fundou também a congregação das Servas do Santíssimo Sacramento, para a adoração perpétua.
Quem muito ajudou São Pedro Julião com suas orações e incentivo, nas muitas dificuldades que teve que enfrentar, foi o Santo Cura d’Ars, com quem esteve mais de uma vez, e que dele falou a outros nos melhores termos.
O Pe. Eymard, que fora a Roma para tratar da aprovação canônica de sua congregação, teve um êxtase na Basílica do Vaticano, justamente no local em que deveria passar o cortejo pontifício. Pio IX, vendo aquele padre tão recolhido, fez sinal aos guardas que se desviassem e não perturbassem seu recolhimento.
Uma pessoa que conheceu bem o Pe. Eymard descreve-o assim: “Era de estatura mais bem alta, magro, ossudo; tinha uma face não propriamente bela, mas marcada com traços salientes, que a tornavam verdadeiramente escultural. A fronte era larga, os pomos salientes, os olhos celestes, um olhar profundo e límpido sob sobrancelhas bem definidas. O nariz reto, os lábios nem grossos nem finos, abertos num sorriso benigno”.
O Pe. Eymard compunha poesias e tinha dotes musicais. Tocava piano, violino e guitarra, tendo composto vários motetes eucarísticos.
Sobre as graças próprias ao fundador de uma obra, dizia ele a seus sacerdotes: “Não compreendeis o favor, a graça que o Senhor vos faz ao colocá-los junto da própria nascente do Instituto. Não me perguntais nada, não vos valeis disso. Eu também sou mortal, e quando não estiver mais aqui, nenhum outro terá as graças do fundador”. São Pedro Julião Eymard faleceu no dia 1º de agosto de 1868, aos 57 anos de idade.
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