Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
4 min — há 10 anos — Atualizado em: 9/1/2017, 8:50:55 PM
As cerimônias da Semana Santa, nas quais se recordam a Paixão e Morte dolorosíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo e a sua gloriosa Ressurreição, levam-nos a meditar na gravidade do pecado e na infinita justiça de Deus, assim como na Sua infinita misericórdia.
Com efeito, o pecado de nossos primeiros pais, pelo qual “entrou o pecado no mundo” (Romanos, 5:12), foi uma revolta contra Deus, uma desobediência gravíssima ao Criador e uma suma ingratidão para com o Benfeitor.
Sendo Deus infinito, a ofensa feita a Ele tem algo de infinito, pois, conforme Santo Tomás: “um pecado cometido contra Deus tem algo de infinito por causa da infinita majestade de Deus.”[1]
Portanto, a ofensa de Adão e as nossas ofensas a Deus exigem uma reparação que satisfaça a infinita justiça divina. Essa satisfação foi feita pela Encarnação, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. E nisso se manifestou a infinita misericórdia de Deus.
Pela sua justiça, Deus exigiu uma satisfação infinita, a qual foi cumprida pelo seu Filho Unigênito; por sua misericórdia, Ele consentiu nessa imolação para restabelecer a amizade com os homens e abrir-lhes as portas do Céu. Embora Deus pudesse satisfazer a sua justiça de outro modo, Ele quis usar aquela que nos tornasse evidente o seu infinito amor por nós.
Por isso, o pecado grave, sobretudo o estado de pecado (como viver em adultério), é uma ofensa ao mesmo tempo contra a justiça e a misericórdia de Deus. Misericórdia demonstrada sobretudo através da Encarnação, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Estas considerações são muito necessárias hoje em dia quando se espalha uma noção de misericórdia sem justiça, ou se retoma o erro luterano da fé sem a necessidade das boas obras.
As Sagradas Escrituras e a tradição da Igreja abundam em citações sobre a misericórdia divina. Mas também a respeito de sua justiça e do castigo pelo pecado.
Assim, adverte o Eclesiastico: “Não digas: A misericórdia do Senhor é grande, ele terá piedade da multidão dos meus pecados, pois piedade e cólera são nele igualmente rápidas, e o seu furor visa aos pecadores” (5:6-7).
Invocar a misericórdia divina como escusa para continuar a pecar é zombar de Deus. E São Paulo nos previne: “Não vos enganeis: de Deus não se zomba” (Gal 6:7).
Em seu canto de ação de graças, a Santíssim Virgem proclama que a misericórdia vem ligada ao temor de Deus: “Sua misericórdia se estende, de geração em geração, sobre os que o temem” (1:50).
Já no Antigo Testamento o Senhor afirmara a Sua misericórdia em relação àqueles que O temem, louvam e guardam seus mandamentos (Salmo 102:17; Exodo 20:6; Deuteronomio 5:10).
O temor de Deus, que “é o começo da sabedoria;” (Salmo 110:10), é a filial reverência à infinita majestade da justiça divina, o desejo de não O ofender, de não se afastar de Sua amizade. Em suma o temor filial é fruto do verdadeiro amor a Deus, sem o qual não se adquire a sabedoria.
Muitos procuram hoje criar uma nova forma de pastoral em que não se fale do pecado, não se mencione a justiça divina, nem o castigo, e se use apenas da doçura e nunca da severidade.
Nosso Senhor procurou atrair a si os pecadores. Perdoou a mulher adúltera contrita, converteu a samaritana, elogiou o amor da pecadora arrependida que o ungiu com o bálsamo arômático (S. João 8:1-11; 4:29; 7:47). A doçura de suas palavras percorrem as páginas do Evangelho. Mas, quando preciso, Ele não recuou ante o uso de expressões severas, como para fazer ver sua maldade aos fariseus endurecidos: “hipócritas”, “raça de víboras”, “sepúlcros caiados”, filhos do demônio, etc. (S. Mateus 12:34; 23:27; S. João 8:44).
Foi também com palavras severas que o profeta Natã converteu o rei David, quando este caiu em adultério e foi o responsável pela morte do marido de Betsabé (2 Samuel 11-12). E o resultado foram os belíssimos Salmos penitênciais mostrando a dor de uma alma arrependida.
A prática da misericórdia não pode ser separada da busca da perfeição, como explica o Pe. Théodore Koehler:
“‘Sede misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso.’ (Lucas 6:36). Este convite a imitar a misericórdia divina corresponde a um outro apelo em Mateus 5: 48: ‘Portanto, sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito.’ A misericórdia aparece assim, desde os primórdios do cristianismo, como a realização do crescimento espiritual na perfeição pregada por Jesus.”[2]
A verdadeira pastoral deve, pois usar dos meios psicológicos adequados, a doçura ou o rigor, para converter ou afervorar as pessoas. Mas tendo sempre em vista afastá-las do pecado, lembrando sempre a inevitabilidade dos Novíssimos: Morte, Juízo, Inferno, Paraíso. Com isso se evita cair em pecado como ensina o Ecclesiastico: “Em tudo o que fizeres, lembra-te de teu fim, e jamais pecarás.” (7:40).
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[1] Summa Theologica, 3, q.1, a.2, ad 2.
[2] Article « Miséricorde », in Dictionnaire de Spiritualité, Beauchesne, v. 10, col. 1313.
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