Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
32 min — há 5 anos — Atualizado em: 11/6/2020, 10:14:18 PM
Diantedesta situação geral, é lícito não apenas ficar perplexo, masaté resistir, segundo o modelo ensinado por São Paulo (Gal 2, 11).Não se trata de pôr em discussão a autoridade pontifícia —perante a qual nosso amor e nossa veneração não devem senãocrescer —,mas é o próprio amor ao Papado que deve nos levar à resistência agestos, declarações e estratégias político-pastorais quecontrastam com o depositum fideie a Tradição da Igreja. Se é verdade que nenhuma heresia pode serensinada infalivelmente pelos Papas, também é verdade que um Papapode errar se não fizer uso do carisma da infalibilidade ou abordaruma questão não coberta por esse último. E, nesse caso, por amor àverdade e à Igreja, os fiéis podem e devem resistir.
Todofiel que ama verdadeiramente a Igreja é levado a ter grande respeitoe afeição pelo Papado, pela Sagrada Hierarquia e pelo magistérioeclesiástico. Essa ligação espiritual o leva a achar inimaginávelou, pelo menos, a admitir dificilmente que a Igreja possa alguma vezerrar, mesmo em assuntos disciplinares. Essa atitude psicológica seviu reforçada pelo renovado prestígio que o Papado adquiriu com aproclamação dos dogmas da primazia de jurisdição do Sucessor dePedro e da infalibilidade pontifícia, na Constituição PastorAeternus do Concílio Vaticano I,promulgada pelo Beato Pio IX.
Aolongo do século XX, porém, e de modo mais pronunciado na crise quese manifestou principalmente a partir do Concílio Vaticano II— cujos episódios mais notórios consistiram na revolta deprelados e teólogos progressistas contra documentos pontifícios deteor tradicional, como as encíclicas Humanaevitae e VeritatisSplendor —, uma posição erradacomeçou a se esgueirar na atitude de alguns dos melhores católicosconservadores. Tal posição consistia em criticar os progressistas,não tanto por se afastarem do ensino tradicional, mas por atacarem omagistério do Papa reinante; de maneira que, no subconsciente dosque assim agiam, a regra da ortodoxia deixou de ser primordialmente aconcordância com o ensino das Sagradas Escrituras e da Tradição,passando a ser a concordância com o magistério mais recente, comose este fosse a regra máxima da fé.
Essedesvio, chamado por alguns de “magisterialismo”1,desembocou inevitavelmente numa forma de positivismo magisterialmuito parecida com o positivismo legal. Assim como este últimosustenta que a lei é lei não por ser justa, mas por ter sidopromulgada pela autoridade competente, o positivismo magisterialafirma que, por ser o magistério atual a regra suprema, tem de serverdadeiro tudo quanto afirmem o Papa de turno e os bispos que oseguem2.
Asnovidades magisteriais implícitas na mudança de paradigma promovidapelo Papa Francisco deram origem a esta situação paradoxal:enquanto os conservadores afetados pelo “magisterialismo” ficaramparalisados ante a perspectiva de terem que discordar do Papareinante, os antigos rebeldes se transformaram em corifeus domagistério papal.
Defato, segundo prelados, teólogos e intelectuais favoráveis aoralliement daIgreja com Modernidade — ou seja, com a Revolução anticristã —,os fiéis católicos seriam obrigados em consciência a acompanhar orumo que o Papa Francisco vem imprimindo à Igreja, e julgam que nãoseria lícito discordar de seus ensinamentos ou resistir às suasorientações e decisões nessa direção.
Sintomáticodisso é o fato — relativamente à controvérsia sobre a comunhãopara os divorciados recasados — de figuras representativas dacorrente progressista e de outras próximas do Papa Francisco teremalegado que sua clara mudança de orientação seria o resultado deuma ação direta do Espírito Santo, e que, portanto, recusá-laequivaleria a opor-se aos desígnios de Deus.
Ocaso mais expressivo é o de Mons. Pio Vito Pinto,decano da Rota Romana, o qual, ementrevista para Religión Confidencial,declarou que as pessoas que exprimemdúvidas em relação à Amoris laetitiaestão questionando “dois sínodos debispos sobre o matrimônio e a família. Não um sínodo, mas dois!Um ordinário e outro extraordinário. Nãose pode duvidar da ação do Espírito Santo”,concluiu ele3.Daí que, para essa corrente progressista, a oposição a taisreformas não pode provir senão do egocentrismo4,da defesa egoística de antigos privilégios5ou simplesmente do medo de sair da rotina por temor da mudança6.
Issoleva os paladinos da corrente progressista a exigir uma adesão totalao novo magistério, sem fazer as devidas distinções entre osdiferentes graus de solenidade dos ensinamentos pontifícios e doassentimento devido aos mesmos. Por exemplo, em uma entrevista para arevista jesuíta dos Estados Unidos, o cardeal Donald Wuerl, falandodos opositores da linha seguida pelo atual pontífice, afirmou: “AIgreja ‘com e sob Pedro’ vai adiante. Sempre há gente que estádescontente com algo que acontece na Igreja, mas a pedra de toque docatolicismo autêntico é a adesão aoensinamento do Papa. A roca é Pedro, apedra de toque é Pedro e, como diz o Santo Padre, é a garantia daunidade. […] Eles [os Papas] são a pedra de toque da autenticidadeda fé”7.
Criticandoexplicitamente um dos cardeais signatários dos dubiasobre a interpretação da Amorislaetitia, o cardeal Oscar RodríguezMaradiaga, arcebispo de Tegucigalpa e secretário do Conselho dosNove para a reforma da Cúria, no livro que lançou em 2017 naItália, chegou a identificar a pessoa do Papa com o magistério daIgreja: “Ele [o cardeal Burke] não é o magistério: oSanto Padre é o magistério, e é estequem ensina a toda a Igreja. Esse outro exprime somente suas própriasideias, que não merecem mais comentário. São apenas palavras de umpobre homem” [sic!]. E acrescentou, sem as devidas distinções, noparágrafo final: “Os cardeais ‘papáveis’ que [osconservadores] queriam ficaram ali mesmo, enquanto aqueleque o Senhor quis é o que foi eleito8;logo, o dissenso é lógico e compreensível, [porque] não podemostodos pensar do mesmo jeito; todavia, é Pedro quem guia a Igreja e,portanto, se temos fé devemos respeitar as escolhas e os estilos doPapa vindo do ‘fim do mundo’. […] Se alegam encontrar uma‘heresia’ nas palavras de Francisco,estão cometendo um grande erro, porque estão pensando somente comohomens e não como o Senhor quer.[…]”.
Ocardeal Maradiaga conclui o prefácio de seu livro dizendo que épreciso uma lealdade incondicional ao ocupante da cátedra de Pedro:“Antes se chamava Bento, antes disso se chamava João Paulo II, eassim por diante. O que Jesus me pede é ser leal a Pedro. Quem nãofaz isso procura apenas popularidade”9.
Oex-presidente da diminuta Conferência Episcopal da Grécia — ocapuchinho Dom Fragkiskos Papamanolis, bispo emérito di Syros,Santorini e Creta —, chegou a afirmar que os cardeais queapresentaram os dubia, alémdo pecado de escândalo, cometeram “o pecadode heresia (e de apostasia? Assim, defato, começam os cismas na Igreja)”. E acrescentou: “Fica clarono vosso documento que na prática nãoacreditais na suprema autoridade magisterial do papa,reforçada por dois sínodos de bispos provenientes de todo o mundo.Vê-se que o Espírito Santo inspirasomente vós, e não o Vigário de Cristoe nem sequer os bispos reunidos em Sínodo”10.
Atéem uma matéria tão contingente como a da imigração não seriaaparentemente lícito dissentir do Papa Francisco. O jornalistaLaurent Dandrieu conta em seu já citado livro o expressivo caso dosacerdote e capelão militar Christian Venard, que após assurpreendentes declarações papais identificando a violênciaislâmica com a suposta violência católica, escreveu um primeiroartigo intitulado “O Papa Francisco e a ‘violência católica’:estupefação, reflexão e reverência”11,mas que, na semana seguinte, se viu obrigado a escrever um segundoartigo com o título “Prefiro enganar-me com o Papa a ter razãocontra ele” e o subtítulo “Da necessidade de seguir o SantoPadre em qualquer circunstância”12,excetuando depois, no corpo do artigo, apenas o pecado.
Outroexemplo de promoção de uma aceitação incondicional foi fornecidopelo teólogo Ashley Beck, professor de doutrina social da Igreja naUniversidade St Mary’s, no sudeste de Londres, a respeito daLaudato Sì:“Enquanto a Igreja permite pontos de vista divergentes em algunsassuntos (Laudato Sì,61), não somos livres de dissentir dosensinamentos dessa encíclica, domesmo modo como não somos livres de dissentir do ensinamentocatólico sobre outros assuntos morais”13.
Oque pensar dessas avaliações? São elas doutrinariamente aceitáveise factualmente objetivas e justas? É mesmo melhor, como disse ocapelão militar francês, “enganar-se com o Papa a ter razãocontra ele”? Pede porventura o Espírito Santo que renunciemos ànossa razão? Ou que, pelo contrário, permaneçamos fiéis àsverdades perenes e imutáveis da fé católica, nutrindo-nos paraisso com o sensus fidei paraque possamos, se necessário, resistir às autoridades eclesiásticas?
Nãoé preciso possuir um conhecimento especializado de eclesiologia paracompreender que a autoridade e a infalibilidade papais têm limites eque o dever de obediência não é absoluto. Essa posiçãoequilibrada pode ser sintetizada nas seguintes verdades, que fazemparte do patrimônio intelectual e espiritual de todo católico bemformado:
Pelafé sabemos que, por vontade expressa do mesmo Jesus Cristo, o Papa éa cabeça da Igreja visível enquanto sucessor de Pedro a quem foramdadas as chaves do Reino, o que explica não somente todo o nossoamor por ele (“o doce Cristo na terra”, como dizia Santa Catarinade Siena), mas também a obediência aos seus ensinamentos e decisõesenquanto Doutor e Pastor universal do rebanho de Cristo. Mas, comolembrou oportuna e concisamente Dom Athanasius Schneider,bispo-auxiliar de Astana, em uma entrevista ao portal católicoRorate Coeli,“a Igreja não é propriedade privadado Papa. O Papa não pode dizer: ‘Eu sou a Igreja’, como fez orei da França Luís XIV, que disse: ‘L’État,c’est moi !’ [O Estado sou eu!] OPapa é somente o Vigário, não o sucessor de Cristo”14.
Defato, o Papa — cujo ministério supremo é o de “confirmar seusirmãos” na fé (Lc 22,32) — é o primeiro a dever custodiar, interpretar e anunciar aomundo a Palavra de Cristo, sem nada ajuntar nem tirar (Dt4, 2). Como disse o apóstolo São Paulo, “ainda que alguém —nós ou um anjo baixado do céu — vos anunciasse um evangelhodiferente do que vos temos anunciado, que ele seja anátema” (Gal1, 8). Por isso, no próprio preâmbuloda constituição Pastor Aeternus,que define a infalibilidade pontifícia, o Concílio Vaticano Ideclara solenemente que “o Espírito Santo não foi prometido aossucessores de São Pedro para que estes, sob a revelação do mesmo,pregassem uma nova doutrina, mas paraque, com a sua assistência, conservassem santamente e expusessemfielmente o depósito da fé, ou seja,a revelação herdada dos Apóstolos”15.
Nãohá dúvida de que o sopro do Espírito Santo “renova a face daterra” (Sal103, 30) e conduz a Igreja à plenitude da verdade (Jo16, 13), servindo-se do seu magistériovivo — e especialmente do magistério pontifício — para mediar eatualizar o ensinamento divino imutável. Mas Ele o faz, não nosentido de ensinar verdades novas, mas no sentido de aprofundarmelhor essas mesmas palavras reveladas que não passam (Mt24, 35). O magistério, portanto, nãocontém e não propõe nenhuma novidade, mas reitera e aprofunda deuma maneira nova a mesma verdade contida nas Escrituras e naTradição: non nova sed nove.Por isso, no exercício do magistério deve estar ausente a menorsombra de contradição entre verdades antigas e novas, uma vez queas verdades contidas no depósito da fé são imutáveis e oprogresso na sua compreensão deve ser “no mesmo sentido, segundouma mesma interpretação” (Comonitório de São Vicente de Lérins,23)16.A verdade católica não subsistiria, não haveria verdadeiraTradição, se houvesse contradição entre um ensinamento oudisciplina nova e um ensinamento ou disciplina imemorial17.
Ainfalibilidade do ensino — ou seja, a não contradição com odepósito da fé confiado à Igreja — foi garantida à Igrejaunicamente em duas situações bem precisas: a) nas declaraçõessolenes (ex cathedra)do Papa ou de um concílio reunido eaprovado pelo Papa; e b) no ensinamento ordinário universal dosbispos em união com o Papa18,ou seja, naquilo que foi ensinado “em todas as partes, sempre e portodos”19.Logo, os ensinamentos do magistério quotidiano ou autêntico que nãogozam de nenhuma antiguidade e trazem novidades não estãorevestidos do carisma da infalibilidade e, portanto, não constituemregra próxima da fé (a qual não admite nenhuma dúvida). A elesdeve ser dado não um assentimento de fé, mas apenas um assentimentoreligioso da inteligência e da vontade20.
Ora,quando aparece claramente uma contradição entre uma novidademagisterial e o ensino tradicional – ou quando um ensinamento ouuma prescrição são claramente contrárias à razão (como naquestão da imigração ou da agenda ecológica radical) – nãoé obrigatório “errar com o Papa”21,sendo perfeitamente legítimo suspender prudencialmente oassentimento22e até mesmo fazer-lhe uma “correção fraterna”23.Vale para o magistério pontifícioou para os gestos ou atitudes do Papa aquilo que Mons. BruneroGherardini, por muitos anos decano da faculdade de Teologia daUniversidade Lateranense, afirmou, com sua profundidade habitual, arespeito do magistério da Igreja em geral: “O Magistério não éuma super-igreja que imporia seus juízos e comportamentos à própriaIgreja, nem uma casta privilegiada acima do povo de Deus, uma espéciede poder forte ao qual se deveria obedecer e ponto final. (…) Muitofrequentemente se faz do instrumento um valor em si [independente], ese recorre a ele para cortar toda discussão desde sua origem, comose ele estivesse acima da Igreja e como se não houvesse diante de sio peso enorme da Tradição a acolher, interpretar e retransmitir emsua integridade e fidelidade”24.
Maisainda, em casos graves é legítimo resistir publicamente aospastores — e até mesmo ao Pastor Supremo —, quando a resistênciaprivada ou o simples silêncio obsequioso não for suficiente paraque os fiéis permaneçam fortes na fé (1P 5, 9); para a salvaguarda da fé daIgreja, ou ainda para a defesa do pouco que resta de cristão nospaíses em que os fiéis são cidadãos.
São numerosos os tratadistas do melhor quilate que reconhecem explicitamente a legitimidade da resistência pública às decisões ou ensinamentos errados dos pastores, inclusive do Soberano Pontífice. Eles foram amplamente citados no estudo de Arnaldo Xavier da Silveira intitulado “Resistência pública a decisões da autoridade eclesiástica” e publicado pela revista Catolicismo em agosto de 196925. O primeiro desses grandes autores citados é o próprio Santo Tomás de Aquino26, seguido de São Roberto Bellarmino27, Suárez28, Vitória29, Cornélio A Lápide30, Werns-Vidal31 e Peinador32.
Analisandoas passagens em que certos tratadistas parecem legitimar apenas osilêncio obsequioso, mas não a resistência pública, o estudocitado mostra que tais autores tratam de casos ordinários, mas nãodos casos extraordinários nos quais há um “perigo próximo para afé” do povo cristão (Santo Tomás), uma manifesta “agressão àsalmas” (São Roberto Bellarmino) ou um “escândalo público”(Cornélio A Lápide). “Sustentar o contrário seria desconhecer opapel fundamental da Fé na vida cristã”, conclui A. Xavier daSilveira, em cuja opinião isso é válido tanto para os ensinamentosdoutrinários quanto para as decisões disciplinares.
Odireito a seguir a via da fidelidade ao Evangelho em matéria de fée de moral e, em matéria contingente, a liberdade de consciência deseguir as próprias convicções (baseadas nas análises da própriarazão) são tanto mais impreteríveis quanto a mudança de paradigmada Igreja — promovida pelo Papa Francisco e descrita neste trabalho— abre as portas à penetração torrencial dos erros da Revoluçãoanticristã na Igreja.
Oanteriormente visto importa em submeter a uma coação a consciênciabem formada de milhões de católicos, os quais se veem impelidospelas mais altas autoridades da Igreja Católica a aceitar:
Essacoação sobre as almas é ainda redobrada pelo fato de o PapaFrancisco procurar amiúde desqualificar a atitude de fidelidade aosditames do Evangelho e da razão com imagens e epítetos ofensivosque encontram muita repercussão na grande imprensa e favorecem umaverdadeira “caça às bruxas” daqueles que dissentem daorientação do atual pontificado. “Fundamentalistas”, “rígidos”,“hipócritas”, “duros de coração”, “legalistas”,“restauracionistas”, “casuístas”, “contabilistas doEspírito”, “pelagianos”, “sombrios”, “pietistas”,“doutores da lei”, “reacionários” etc. são os epítetos queo Papa Francisco se compraz em empregar para estigmatizar, semnomeá-los explicitamente, aqueles que criticam suas opçõespastorais e as ideias que as fundamentam33.
Aplica-seao caso o que o bispo Athanasius Schneider comentou a respeito dasdiscussões nos dois sínodos sobre a família: “Na grande criseariana do século IV, os defensores da divindade do Filho de Deustambém foram apelidados de ‘intransigentes” e‘tradicionalistas’. Santo Atanásio foi até excomungado peloPapa Libério e o Papa justificou isso com o argumento de queAtanásio não estava em comunhão com os bispos orientais, a maioriados quais eram hereges ou semi-heréticos. Nessa situação, SãoBasílio o Grande declarou o seguinte: ‘Somente um ‘pecado’ éhoje punido com severidade: a observância cuidadosa das tradiçõesdos Padres da Igreja. Por esse motivo os bons são despojados de seuscargos e expulsos ao deserto’ (Ep. 243)”. Prossegue DomAthanasius: “Na verdade, são os bispos os novos Fariseus eEscribas que apoiam a santa Comunhão para os ‘divorciadosrecasados’, já que eles desdenham o mandamento de Deus,contribuindo para que os adultérios continuem a provir do corpo e docoração dos ‘divorciados recasados’ (Mt15, 19), e porque querem uma solução exteriormente ‘limpa’ eeles próprios aparecerem ‘limpos’ aos olhos dos poderosos (amídia, a opinião pública)”34.
NossoSenhor nos ensina no Evangelho a “oferecer a outra face” e a“orar pelos que nos maltratam” (Mt5, 39, 44). Estamos certos de que,individualmente considerados, esses milhões de católicos perplexosaceitam com resignação a coação à qual suas convicçõesracionais e sua integridade moral são submetidas. Mas eles podem, epor vezes devem, falar quando esses ataques põem em risco nãosomente a sua própria fé, mas ainda a de milhões de outros maisfracos, e até a própria existência de suas nações. Postos dianteda alternativa de cruzar resignadamente os braços para nãodiscordar do Papa Francisco ou resistir às suas opções pastorais esociopolíticas, eles podem, por uma questão de consciência,sentir-se obrigados a “resistir-lhe em face”, como São Pauloresistiu a São Pedro (Gal 2,11-14).
Omodelo de resistência — ao mesmo tempo firme e impregnado deveneração e respeito pelo Sumo Pontífice — no qual essescatólicos podem pautar a sua própria reação, é a Declaração deResistência à Ostpolitik doPapa Paulo VI, redigida pelo saudoso Prof. Plinio Corrêa de Oliveiraem abril de 1974 sob o título “Apolítica de distensão do Vaticano com os governos comunistas —Para a TFP: omitir-se? ou resistir?”. Em seu parágrafo crucial,ela dizia:
“Ovínculo da obediência ao Sucessor de Pedro, que jamais romperemos,que amamos com o mais profundo de nossa alma, ao qual tributamos omelhor de nosso amor, esse vínculo nós o osculamos no momento mesmoem que, triturados pela dor, afirmamos a nossa posição. E dejoelhos, fitando com veneração a figura de S.S. o Papa Paulo VI,nós lhe manifestamos toda a nossa fidelidade.
“Nesteato filial, dizemos ao Pastor dos Pastores: Nossa alma é Vossa,nossa vida é Vossa. Mandai-nos o que quiserdes. Só não nos mandeisque cruzemos os braços diante do lobo vermelho que investe. A istonossa consciência se opõe.”35
O livro pode ser lido na integra na pagina: https://ipco.org.br/a-mudanca-de-paradigma/
O livro A “mudança de paradigma” do Papa Francisco – Continuidade ou ruptura na missão da Igreja? pode ser comprado na livraria Petrus:
http://www.livrariapetrus.com.br/Produto.aspx?IdProduto=382&IdProdutoVersao=394&cod=73114
1 Pe. Chad Ripperger, “Operative point of view”, Christian Order, março de 2001 (http://www.christianorder.com/features/features_2001/features_mar01.html).
2 Esse positivismo magisterial foi em parte favorecido pelo costume dos Papas do pós-Concílio Vaticano II de apoiar preferentemente seus ensinamentos, além das Sagradas Escrituras, nos textos desse Concílio e em documentos magisteriais pós-conciliares. O Papa Francisco levou ao extremo essa prática da auto-referenciamento citando de preferencia seu próprio magistério.
3 http://www.religionconfidencial.com/vaticano/Decano-Rota-Romana-Papa-cardenalato_0_2828717124.html
4 O cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington, escreveu no seu blog pessoal o que segue: “Uma das coisas que aprendi em todos esses anos, a partir daqueles primeiros ingênuos dias de 1961 [seus anos de seminário], é que, avaliando mais atentamente, encontra-se um fio comum que atravessa todos esses dissidentes. Eles estão em desacordo com o Papa porque ele não está de acordo com eles e não segue as suas posições. O dissenso talvez seja algo que teremos sempre, deplorável enquanto tal, mas teremos também sempre Pedro e seu sucessor como uma rocha e pedra de toque da nossa fé e da nossa unidade”. (http://cardinalsblog.adw.org/2015/02/pope-touchstone-faith-unity/)
5 O cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga, coordenador do Conselho que orienta o Papa na reforma da Cúria, referindo-se nominalmente ao cardeal Burke, escreveu no prefácio de um recente livro-entrevista: “O cardeal que sustenta isso é um homem decepcionado, que queria o poder e o perdeu. Ele achava que era a autoridade máxima nos Estados Unidos.”
6 O cardeal Donald Wuerl, questionado pela revista dos jesuítas dos Estados Unidos sobre qual seria o motivo da oposição ao Papa Francisco, respondeu: “Penso que ela surge em vários níveis. Surge quando o Santo Padre considera uma estrutura que inclui todas as instituições que fazem parte da Santa Sé, como a Secretaria de Estado, dicastérios, congregações, e pergunta se isso não deveria ser analisado para ver se está realmente funcionando como deveria. Assim que se toca num desses, se mexe em interesses pessoais, então haverá sempre alguma oposição, por causa do instinto natural de dizer ‘sempre foi feito assim, para que precisa mudar?’ […] Há também alguns que, acho eu, se sentem muito desconfortáveis; tudo era garantido e seguro e agora está sendo questionado. Pede-se a eles para olhar a maneira como estão fazendo as coisas rotineiras e Francisco lhes pede para verificar se essa é realmente a melhor maneira de fazer”.
7 https://www.americamagazine.org/content/dispatches/cardinal-wuerl-calls-out-popes-opponents
8 Em 1997, perguntado pela televisão bávara se é o Espírito Santo que elege o Papa, o então cardeal Ratzinger respondeu: “Eu não diria isso, no sentido de que é o Espírito Santo que escolhe o Papa. […] Eu diria que o Espírito Santo não toma exatamente controle do assunto, mas como um bom educador, por assim dizer, nos deixa muito espaço, muita liberdade, sem nos abandonar inteiramente. Logo, o papel do Espírito Santo deveria ser entendido em um sentido muito mais elástico, não que Ele dite o candidato pelo qual se deve votar. Provavelmente a única segurança que Ele oferece é de que a coisa não pode ser inteiramente desastrosa”. (http://ideas.time.com/2013/03/11/does-the-holy-spirit-choose-the-pope/). No caso específico da eleição do cardeal Jorge Mario Bergoglio, as revelações de Jürgen Mettepenningen e Karim Schelkens na sua biografia sobre o cardeal Godfried Daneels tornaram manifesta a existência de uma autodenominada “máfia de Sankt Gallen” no conclave de 2013, e de que houve forte interferência de fatores muito humanos e dificilmente associáveis ao Espírito Santo. Eis o que esse respeito disse Karim Schelkens em uma entrevista de imprensa: “A eleição de Bergoglio foi preparada em Sankt-Gallen, sem nenhuma dúvida. E as principais linhas do programa que o Papa está levando adiante são as que Daneels e Cia. começaram a discutir mais de dez anos atrás” (http://www.knack.be/nieuws/mensen/godfried-danneels-was-al-jaren-in-de-weer-als-king-maker-van-paus-franciscus/article-longread-607599.html). Posteriormente, os jornalistas esclareceram que tinham dito apenas que “a eleição de Bergoglio correspondia aos objetivos de Sank-Gallen”
(http://www.ncregister.com/blog/edward-pentin/st.-gallen-group-not-a-lobby-group-say-authors).
9 Oscar A. Rodriguez Maradiaga e Antonio Carriero, Solo il Vangelo è rivoluzionario: La Chiesa di oggi e quella di domani nelle riforme di Francesco, http://www.ilsussidiario.net/News/Cronaca/2017/5/19/SCONTRO-SU-PAPA-FRANCESCO-Card-Maradiaga-Burke-pover-uomo-in-conclave-lobby-anti-Bergoglio-/765004/
10 http://www.settimananews.it/vescovi/lettera-aperta-ai-4-cardinali/
11 https://fr.aleteia.org/2016/08/02/le-pape-francois-et-la-violence-catholique-stupefaction-reflexion-et-reverence/
12 https://fr.aleteia.org/2016/08/12/je-prefere-me-tromper-en-suivant-le-pape-que-davoir-raison-contre-lui/
Levando essa posição até o seu extremo, o sociólogo Massimo Introvigne, em um dossiê sobre “A realidade do fundamentalismo católico”, condenou o fato de o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira ter publicado uma análise crítica da Amoris laetitia na qual reconhece que a exortação é parte do magistério autêntico não infalível, mas lhe recusa o assentimento naquelas afirmações dissonantes da doutrina católica, o que, segundo o sociólogo, jogaria a entidade no campo do “fundamentalismo”. E qual seria o erro principal desse suposto fundamentalismo? É que “Jesus não escreveu livros, não deixou nada escrito, à diferença de outros fundadores de religiões. […] Maomé deixou o Livro a ser seguido, Jesus deixou a Igreja: ‘Quem a vós escuta, a Mim escuta’ (Luc 10, 13). Ele deixou pessoas. Que se podiam e podem encontrar. Por isso, fico sabendo se sou católico caso eu siga a pessoa do Papa, não um texto hipotético mais ou menos fossilizado”, identificado com a Tradição (La realtà del fondamentalismo cattolico, in http://www.lanuovaeuropa.org/articoli/dossier/la-realt%C3%A0-del-fondamentalismo-cattolico).
13 http://www.catholicherald.co.uk/commentandblogs/2015/06/19/no-catholic-is-free-to-dissent-from-the-teaching-of-laudato-si/
14 http://adelantelafe.com/exclusiva-rorate-caeli-entrevista-al-obispo-athanasius-schneider-fsspx-la-mujer-y-el-lavado-de-pies-consagracion-de-rusia-obispos-antipastorales-y-mucho-mas/
15 http://www.veritatis.com.br/constituicao-dogmatica-pastor-aeternus-18-07-1870/
16 “Talvez alguém diga: então nenhum progresso da religião é possível na Igreja de Cristo? Certamente que deve haver progresso, e grandíssimo! Quem poderá ser tão hostil aos homens e tão contrário a Deus para tentar impedi-lo? Mas sob a condição de que se trate verdadeiramente de progresso pela fé, não de modificação. É característica de toda forma de progresso a inteligência, o conhecimento, a sabedoria — tanto da coletividade como do indivíduo — de toda a Igreja, segundo as idades e os séculos; com tal que isso suceda exatamente segundo a sua natureza peculiar, no mesmo dogma, no mesmo sentido, segundo uma mesma interpretação” (https://fr.scribd.com/document/42014484/Commonitorium-Sao-Vicente-de-Lerins).
17 Por isso é absurda a alegação do atual Prepósito Geral da Companhia de Jesus, Pe. Sosa Abascal, de que é preciso “contextualizar” as palavras de Jesus a respeito da indissolubilidade do casamento, uma vez que “naquele tempo ninguém tinha um gravador para registrar as palavras”, porque desde os primórdios da Igreja tais palavras de Nosso Senhor foram aceitas “no mesmo sentido, segundo uma mesma interpretação”.
18 Constituição Dei Filius do Concílio Vaticano I: “Deve-se, pois, crer com fé divina e católica tudo o que está contido na palavra divina escrita ou transmitida pela Tradição, bem como tudo o que a Igreja, quer em declaração solene, quer pelo Magistério ordinário e universal, nos propõe a crer como revelado por Deus” (http://www.veritatis.com.br/constituicao-dogmatica-dei-filius-24-04-1870/).
19 Comonitório de São Vicente de Lérins: “É, pois, sumamente necessário, ante as múltiplas e arrevesadas tortuosidades do erro, que a interpretação dos Profetas e dos Apóstolos se faça seguindo a pauta do sentir católico. Na Igreja Católica deve-se ter maior cuidado para manter aquilo em que se crê em todos os lugares, sempre e por todos. Isto é o verdadeiro e propriamente católico, segundo a ideia de universalidade que se encerra na mesma etimologia da palavra. Mas isto se conseguirá se nós seguirmos a universalidade, a antiguidade e o consenso geral. Seguiremos a universalidade se confessarmos como verdadeira e única fé a que a Igreja inteira professa em todo o mundo; a antiguidade, se não nos separarmos de nenhuma forma dos sentimentos que notoriamente proclamaram nossos santos predecessores e pais; o consenso geral, por fim, se, nesta mesma antiguidade, abraçarmos as definições e as doutrinas de todos, ou de quase todos, os Bispos e Mestres” (ibid).
20 Ao magistério ordinário do Romano Pontífice — diz o conceituado teólogo jesuíta Domenico Palmieri (1829-1909) — “é devido, em segundo lugar, também certo assentimento religioso, quando não há nada que leve (suadeat) prudentemente a uma suspensão do assentimento. Explico os termos. Não dizemos que é devido um assentimento de fé católica, pois uma doutrina a ser professada (tenenda) não é proposta aqui pela Igreja. Não dizemos que é devido o assentimento formal de fé divina, pois esse assentimento é devido à proposição infalível que consta ser tal e, na nossa hipótese, tal proposição não existe. Não dizemos que se trata de assentimento metafisicamente certo, pois não existindo a certeza da infalibilidade, não aparece, por isso mesmo, como impossível o erro e, assim, vê-se que o oposto pode ser verdadeiro. Existindo tal conhecimento, não pode haver lugar para a certeza metafísica. Dizemos, então, que o assentimento é moralmente certo e se, consequentemente, aparecem motivos — sejam verdadeiros, sejam falsos, mas oriundos de um erro inculpável — que levem a concluir de outro modo (quanto à matéria ensinada), dizemos que não é devido o assentimento, dado que, nessas circunstâncias, a vontade não age imprudentemente ao suspender o assentimento (https://scutumfidei.org/2013/02/20/assentimento-ao-magisterio-parte-final-doutrina-comum-dos-teologos-e-bibliografia/)
21 No artigo “Pode haver erro em documento do Magistério pontifício ou conciliar?” (Catolicismo, julho de 1969), Arnaldo V. Xavier da Silveira, baseado nos melhores teólogos, demonstra a tese de que “num documento papal pode haver erro pelo fato de não preencher as quatro condições da infalibilidade”, e acrescenta que “o simples fato de se dividirem os documentos do Magistério em infalíveis e não infalíveis, deixa aberta, em tese, a possibilidade de erro em algum dos não infalíveis”.
22 Ver texto de Domenico Palmieri, na nota n° 20 logo acima.
23 Em entrevista ao National Catholic Register, já citada, o cardeal Raymond Burke declarou: “Há, na Tradição da Igreja, a prática da correção do Romano Pontífice. É algo que é claramente incomum. Mas, se não há resposta a essas questões [os dubia], então eu diria que se trataria de fazer um ato formal de correção por um grave erro. […] É a obrigação nesses casos, e historicamente tem acontecido, que cardeais e bispos tornem claro que o Papa está ensinando um erro e lhe peçam para corrigi-lo” (http://www.ncregister.com/daily-news/cardinal-burke-on-amoris-laetitia-dubia-tremendous-division-warrants-action). O Prof. Roberto de Mattei relembra em um artigo que, além das honras e dos privilégios, os cardeais têm obrigações precisas, e que “entre esses deveres figura o de corrigir fraternalmente o Papa quando ele comete erros no governo da Igreja, como aconteceu em 1813, quando Pio VII firmou com Napoleão o Tratado de Fontainebleau, ou em 1934, quando o cardeal-decano Gennaro Granito di Belmonte admoestou Pio XI, em nome do Sacro Colégio, pelo uso desconsiderado que fazia das finanças da Santa Sé” (I doveri irrinunciabili dei cardinali di Santa Romana Chiesa, https://www.corrispondenzaromana.it/i-doveri-irrinunciabili-dei-cardinali-di-santa-romana-chiesa/).
24 http://disputationes-theologicae.blogspot.fr/2011/12/mons-gherardini-sullimportanza-e-i.html. O perigo dessa “instrumentalização” do magistério para fazer passar as novidades foi previsto de antemão por outro expoente da “escola romana”, Mons. Pietro Parente, depois cardeal, em artigo de 10 de fevereiro de 1942, publicado pelo Osservatore Romano, no qual denunciava “a estranha identificação da Tradição (fonte de Revelação) com o Magistério vivo da Igreja (guardião e intérprete da Divina Palavra)”. De fato, se a Tradição e o Magistério são a mesma coisa, a Tradição deixa de ser um depósito imutável da fé e passa a variar conforme o ensinamento do Papa reinante.
(https://www.radiospada.org/2013/10/allorigine-di-un-equivoco-scrittura-tradizione-chiesa-magistero/)
25 http://permanencia.org.br/drupal/node/994#footnoteref34_1b0sm88
26 “Havendo perigo próximo para a fé, os prelados devem ser arguidos, até mesmo publicamente, pelos súditos. Assim, São Paulo, que era súdito de São Pedro, arguiu-o publicamente, em razão de um perigo iminente de escândalo em matéria de Fé. E, como diz a Glosa de Santo Agostinho, “o próprio São Pedro deu o exemplo aos que governam, a fim de que estes, afastando-se alguma vez do bom caminho, não recusassem como indigna uma correção vinda mesmo de seus súditos” (ad Gal 2, 14)” (Summa II-II, q. 33, a. 4, s. 2).
Ao estudar o episódio em que São Paulo resistiu em face a São Pedro, assim escreve Santo Tomás: “A repreensão foi justa e útil, e o seu motivo não foi leve: tratava-se de um perigo para a preservação da verdade evangélica […]. O modo como se deu a repreensão foi conveniente, pois foi público e manifesto. Por isso, São Paulo escreve: ‘Falei a Cefas’, isto é, a Pedro, ‘diante de todos’, pois a simulação praticada por São Pedro acarretava perigo para todos. — Em 1 Tm 5, 20, lemos: ‘Aos que pecarem, repreende-os diante de todos’. Isso se há de entender dos pecados manifestos, e não dos ocultos, pois nestes últimos deve-se proceder segundo a ordem própria da correção fraterna” (ad Gal., 2, 11-14, lect. III. nn. 83-84). “Aos prelados (foi dado exemplo) de humildade, para que não se recusem a aceitar repreensões da parte de seus inferiores e súditos; e aos súditos (foi dado) exemplo de zelo e liberdade, para que não receiem corrigir seus prelados, sobretudo quando o crime for publico e redundar em perigo para muitos” (ad Gal, 2, 11-14, lect. III, n.77).
27 “Assim como é lícito resistir ao Pontífice que agride o corpo, assim também é lícito resistir ao que agride as almas, ou que perturba a ordem civil, ou sobretudo, àquele que tentasse destruir a Igreja. Digo que é lícito resistir-lhe não fazendo o que ordena e impedindo a execução de sua vontade; não é lícito, contudo, julgá-lo, puni-lo ou depô-lo, pois estes atos são próprios a um superior” (De Rom. Pont., lib. II, c. 29).
28 “Se (o Papa) baixar uma ordem contrária aos bons costumes, não se há de obedecer-lhe; se tentar fazer algo manifestamente oposto à justiça e ao bem comum, será lícito resistir-lhe; se atacar pela força, pela força poderá ser repelido, com a moderação própria à defesa justa (cum moderamine inculpatae tutelae)” (De Fide, disp. I, sect. VI, n. 16).
29 “Caietano, na mesma obra em que defende a superioridade do Papa sobre o Concílio, diz no cap. 27: ‘Logo, deve-se resistir em face ao Papa que publicamente destrói a Igreja, por exemplo, não querendo dar benefícios eclesiásticos senão por dinheiro ou em troca de serviços; e se há de negar, com toda a obediência e respeito, a posse de tais benefícios àqueles que os compraram’.
“E Silvestre (Prierias), na palavra Papa, § 4, pergunta: ‘Que se há de fazer quando o Papa, por seus maus costumes, destrói a Igreja?’ E no § 15: ‘Que fazer se o Papa quisesse, sem razão, ab-rogar o Direito positivo?’ A isso responde: ‘Pecaria certamente; não se deveria permitir-lhe agir assim, nem se deveria obedecer-lhe no que fosse mau; mas dever-se-ia resistir-lhe por uma repreensão cortês’.
“Em consequência, se desejasse entregar todo o tesouro da Igreja ou o patrimônio de São Pedro a seus parentes, se desejasse destruir a Igreja, ou outras coisas semelhantes, não se lhe deveria permitir que agisse de tal forma, mas ter-se-ia a obrigação de opor-lhe resistência. A razão disso está em que ele não tem poder para destruir; logo, constando que o faz, é lícito resistir-lhe.
“De tudo isto resulta que, se o Papa, com suas ordens e atos, destrói a Igreja, pode-se resistir-lhe e impedir a execução de seus mandatos […]
“Segunda prova da tese. Por direito natural é lícito repelir a violência pela violência. Ora, com tais ordens e dispensas, o Papa exerce violência, porque age contra o Direito, conforme ficou acima provado. Logo, é lícito resistir-lhe. Como observa Caietano, não afirmamos tudo isto no sentido de que a alguém caiba ser juiz do Papa ou ter autoridade sobre ele, mas no sentido de que é lícito defender-se. A qualquer um, com efeito, assiste o direito de resistir a um ato injusto, de procurar impedi-lo e de defender-se” (Obras de Francisco de Vitoria, pp. 486-487).
30 “Que os superiores podem ser repreendidos, com humildade e caridade, pelos inferiores, a fim de que a verdade seja defendida, é o que declaram, com base nesta passagem (Gal 2, 11), Santo Agostinho (Epist. 19), São Cipriano, São Gregório, São Tomás e outros acima citados. Eles claramente ensinam que São Pedro, sendo superior, foi repreendido por São Paulo […]. Com razão, pois, disse São Gregório (Homil. 18 in Ezech.): ‘Pedro calou-se a fim de que, sendo o primeiro na hierarquia apostólica, fosse também o primeiro em humildade’. E Santo Agostinho escreveu (Epist. 19 ad Hieronymum): ‘Ensinando que os superiores não recusem deixar-se repreender pelos inferiores, São Pedro deu à posteridade um exemplo mais incomum e mais santo do que deu São Paulo ao ensinar que, na defesa da verdade, e com caridade, aos menores é dado ter a audácia de resistir sem temor aos maiores’ ” (ad Gal., 2, 11).
31 “Os meios justos a serem empregados contra um mau Papa são, segundo Suárez (Defensio Fidei Catholicae, lib. IV, cap. 6, nn. 17-18), o auxílio mais abundante da graça de Deus, a especial proteção do Anjo da guarda, a oração da Igreja Universal, a advertência ou correção fraterna em segredo ou mesmo em público, bem como a legítima defesa contra uma agressão quer física quer moral” (Ius can., vol. II, p. 436).
32 “‘Também o súdito pode estar obrigado à correção fraterna de seu superior’ (S. T. II-II, 33, 4). Pois também o superior pode ser espiritualmente indigente, e nada impede que de tal indigência seja libertado pelo súdito. Todavia, ‘na correção pela qual os súditos repreendem a seus prelados, cumpre agir de modo conveniente, isto é, não com insolência e aspereza, mas com mansidão e reverência’ (S. T., ibidem). Por isso, em geral, o superior deve ser sempre advertido privadamente. ‘Tenha-se entretanto presente que, havendo perigo próximo para a fé, os prelados devem ser argüidos, até mesmo publicamente, pelos súditos’ ” (S. T., II-II, 33, 4, 2)” (Cursus Brevior Theol. Mor.”, tomus II, vol. I, p. 287).
33 Um católico recentemente convertido que vive em Brighton (Reino Unido) e anima um blog sobre atualidades da Igreja Católica decidiu fazer uma compilação desses epítetos e a publicou sob o título de O pequeno livro de insultos do Papa Francisco. Foi tal o sucesso da compilação, que ele a destacou de seu blog e a colocou numa página especializada que é regularmente atualizada com novas entradas: http://popefrancisbookofinsults.blogspot.fr/
34 http://www.pch24.pl/against-pharisees,31907,i.html
35 http://www.pliniocorreadeoliveira.info/MAN%20-%201974-04-08_Resistencia.htm
José Antonio Ureta
37 artigosChileno, membro fundador da "Fundación Roma", uma das organizações chilenas pró-vida e pró-família mais influentes; Pesquisador e membro da "Société Française pour la Défense de la Tradition, Famille et Propriété"; colaborador da revista Catolicismo e do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira e autor do livro: "A mudança de paradigma do Papa Francisco: continuidade ou ruptura na missão da Igreja? Relatório de cinco anos do seu pontificado".
Seja o primeiro a comentar!
Seja o primeiro a comentar!