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Plinio Corrêa de Oliveira
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NATAL — Altíssima e sublime união de Nosso Senhor Jesus Cristo com sua Mãe Santíssima


Nas vésperas do Santo Natal de 1968, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira foi solicitado por colaboradores da TFP a comentar a Ladainha do Imaculado Coração de Maria. O texto que segue foi extraído da gravação dessa reunião, não tendo passado pela revisão do autor.

A Ladainha do Imaculado Coração de Maria é quase toda uma transposição de invocações da Ladainha do Sagrado Coração de Jesus ao Imaculado Coração. Transposição adequada, porque Nossa Senhora é a perfeita semelhança de Nosso Senhor. Nessas condições, com as devidas adaptações, d’Ela se pode dizer muito do que se afirma da vida de Jesus.

A título de exemplo, consideremos uma das invocações da Ladainha: Coração de Maria, no qual o Sangue de Jesus, preço de nossa redenção, foi formado”. É uma consideração muito bonita e apropriada para se meditar durante as ações de graças após a comunhão. Pelas leis comuns da reprodução da espécie, o homem traz consigo algo do sangue de seu pai e algo do sangue de sua mãe. Mas o preciosíssimo sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo foi exclusivamente formado por Nossa Senhora, como também a carne sacratíssima d’Ele, pois tratou-se de concepção miraculosa e do parto de uma virgem, não interveio obra de homem.

Santo Agostinho afirmou muito apropriadamente: Caro Christi, caro Mariæ (a carne de Cristo é de algum modo a própria carne de Maria). De maneira que em Nosso Senhor havia tão-só a carne e o sangue de sua Mãe Santíssima.

Assim, compreendemos melhor o que pode ter sido o período em que Nosso Senhor Jesus Cristo estava em gestação no corpo de Maria. Nesse período Ela ia concedendo todos os elementos vitais para a constituição do corpo do Homem-Deus, e já havia a união hipostática, que é a união das naturezas humana e divina na pessoa de Jesus Cristo. Não devemos imaginar que essa união tenha se dado apenas depois do nascimento de Jesus. Ela se deu a partir do momento em que Ele foi concebido. Tendo-se associado a natureza divina à natureza humana, deu-se a união hipostática, e Ele começou a se desenvolver em Nossa Senhora.

Na noite de Natal, a união ápice de Nossa Senhora com seu Filho

Pelas leis das reciprocidades e analogias, tudo indica que, à medida que Nossa Senhora ia concedendo elementos de seu corpo a Seu Divino Filho, por uma reversão também Ele ia concedendo, por assim dizer, Seu espírito à Sua Mãe Santíssima. Ela foi crescendo em união com Ele, de um modo tão insondável que nem podemos imaginar. Ela tinha a capacidade de progredir na virtude, e não cessou de progredir até o último momento de sua vida.

Portanto, durante todo esse tempo da gestação Ela conheceu progressos enormes, insondáveis e maravilhosos, que eram como uma espécie de símile da gestação. Na medida em que Ela concedia sua carne e seu sangue para formar a humanidade santíssima do Filho, Deus também se dava à alma d’Ela; e, por assim dizer (naturalmente entre aspas), ia “divinizando” a alma d’Ela. De maneira que na noite de Natal, quando a obra puríssima das entranhas de Maria estava pronta para nascer, a união d´Ela com o Filho havia atingido um ápice insondável. Ela estava pronta para ser, em todos os sentidos da palavra, a Mãe do Redentor.

De certo modo, pode-se dizer que Maria Santíssima, como mãe, gerava o Filho. Mas de outro lado pode-se também afirmar que Ele, como Filho, preparava n’Ela a mãe perfeita. Por um paradoxo, o Filho gerava a mãe e também a alma que Ela precisava ter para ser a Mãe Santíssima de nosso Divino Salvador. Essa alma chegou a toda sua perfeição, para cumprir o papel de Mãe de Deus, exatamente no momento em que nasceu o Filho de Deus.

Provavelmente, na Noite de Natal, no momento em que se deu o nascimento virginal do Menino Jesus, houve um êxtase sublime em que Nossa Senhora foi elevada a uma intimidade superlativa com a Santíssima Trindade. Nesse sublime momento, virginalmente Ela deu à luz o Verbo de Deus.

Não devemos imaginar a Santíssima Virgem, como às vezes é pintada em algumas iluminuras, deitada, meio dormindo, com o Filho recém-nascido ao lado. Não é incorreto nem inadequado representar desse modo, pois uma pintura não pode representar tudo. Mas a realidade espiritual, que está no fundo de tudo isso, não fica só nesse aspecto, deveria ser representada em um êxtase, um arroubo como não houve na vida de nenhum santo. Durante esse êxtase a alma d’Ela chegou a uma plenitude, à qual se deveriam suceder outras plenitudes; pois a Virgem Mãe crescia em graça, de plenitude em plenitude, de requinte em requinte, para a integridade da santidade que Ela atingiu no último instante de sua vida na Terra.

Aproximando-nos de Maria, estaremos próximos do Menino Jesus

Adoração dos Pastores – Pietro di Giovanni d’Ambrogio (1410–1449). Fondazione Musei Senesi, Siena (Itália).

Podemos imaginar um outro Fra Angélico, que soubesse pintar um quadro contendo essa ideia de um êxtase fabuloso, durante o qual se daria o nascimento do Menino Jesus. O nascimento propriamente dito não seria uma cena “pintável”, porque não se pode ter ideia adequada de como se operou o nascimento virginal. O que sabemos pela fé, é que Nossa Senhora foi virgem antes do parto, durante o parto e depois do parto.

Com essas considerações, compreendemos ainda melhor a forma de união entre Nosso Senhor e sua Mãe Puríssima: uma união estritamente insondável para a mente humana. É inimaginável, mas meditando nisso nos preparamos melhor para nos aproximarmos do Menino Jesus; compreendemos melhor o papel de Nossa Senhora como Medianeira, como nossa intercessora; percebemos melhor como, aproximando-nos d’Ela, nos aproximamos de Deus n’Aquele Menino que nasceu na noite de Natal em Belém; e nos preparamos para fazer uma adequada meditação junto ao Presépio.

Essa meditação não consiste em considerar com uma nota apenas histórica a presença da imagem de Nossa Senhora ao lado do Presépio. Devemos considerar, além da nota histórica, a nota sobrenatural e mística que há no Natal.

Como o Menino Jesus veio a nós por meio d’Ela, só podemos chegar àquele Menino por meio d’Ela. Nossos olhos, voltados para o Presépio, devem fixar-se sobre Ele por meio d’Ela. Consideremos que ali está Jesus. Ele é a Fonte, e ao lado d’Ele está Nossa Senhora, que é o canal para chegarmos a essa Fonte.

São José recebeu graças extraordinárias na noite de Natal

Qual é o papel de São José? Por mais poderosa que seja a intercessão de Nossa Senhora, quis a Divina Providência que tivéssemos intercessores secundários, e entre esses temos São José. Como sabemos, Ele passou por uma provação tremenda, com a sua perplexidade de como poderia um filho nascer de uma Virgem. Para ele, um grande mistério. Houve depois outra provação terrível: o desaparecimento do Menino Jesus, encontrado posteriormente no Templo discutindo com os doutores da lei.

Assim como houve uma preparação de Nossa Senhora para ser verdadeiramente a Mãe de Deus, certamente houve também uma preparação de São José para ele se tornar pai adotivo do Menino Jesus. Se bem que São José não tenha sido o pai natural, como esposo de Maria Santíssima ele tinha direito verdadeiro ao fruto das entranhas d’Ela. Enquanto esposo, tinha direito efetivo sobre o fruto do ventre sacratíssimo de Sua esposa. De maneira que a alma dele também foi sendo preparada para essa grandiosa paternidade. Devemos admitir que, durante a noite de Natal, também São José recebeu graças extraordinárias.

Compreende-se isso pensando nos pastores. É claro que os pastores, chamados para a primeira adoração, receberam graças extraordinárias. Se os simples pastores receberam essas graças, por estarem ali perto, como não admitir, com muito mais razão, que São José as tenha recebido muito maiores? Pela sua união com Nossa Senhora, pela sua relação com o Menino Jesus, devemos ver em São José um intercessor secundário junto a Ela, mas grandíssimo entre os intercessores secundários. Ele é secundário em relação a Nossa Senhora, não em relação aos outros intercessores, em relação aos quais ocupa um lugar eminente, talvez o maior dos lugares.

Somos filhos adotivos da Sagrada Família, de Jesus, Maria e José

Adoração dos Reis Magos – Cornelis van Cleve (1520-1567). Royal Museum of Fine Arts Antwerp, Antuérpia, Bélgica.

Com nosso espírito penetrado por essas considerações, devemos nos aproximar do Natal preparando-nos para as graças dessa noite santa. Seria desfigurar a tradição, e sair do reto caminho, se fizéssemos considerações fora da linha das graças que o Natal confere: graças de apaziguamento, graças de distensão.

Outrora, quando a noite de Natal se aproximava, todos os homens sentiam que uma bênção e uma paz baixavam sobre a Terra, sentiam uma aliança do Céu com a Terra. E ela se renovava de maneira tal, que todo mundo caminhava com placidez, com alegria, com normalidade para aproximar-se do presépio de Natal. E havia uma espécie de desmobilização dos espíritos, um aumento recíproco e cristão do afeto entre todos os homens, com exceção daqueles que não são filhos da luz; ou seja, os filhos das trevas. Tenho impressão de que essa sensação se torna cada vez mais tênue nos dias atuais.

A noite abençoada de Natal deve fazer com que nos sintamos mais do que nunca filhos de Jesus, filhos de Maria, filhos de São José. Portanto, filhos adotivos da Sagrada Família. Desejosos de obter um acréscimo do afeto recíproco, um acréscimo desses vínculos que patentemente a Providência Divina quer instituir entre nós. São vínculos que nos levam ao perdão recíproco, à generosidade, ao esquecimento das faltas, a renovar nossa boa vontade para com os outros, talvez um pouco cansada pelos desgastes diários ao longo dos anos e dos trabalhos.

Que Nossa Senhora, Medianeira de todas as graças, nos conceda a todos essa graça. Que a noite de Natal nos vincule profundamente entre nós, para ficarmos também mais unidos a Ela. Este é o voto que faço em seguida a essa meditação sobre o Coração Imaculado de Maria, enquanto gerando a carne e o sangue infinitamente preciosos do Menino Jesus, nascido para nossa Redenção.

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Fonte: Revista Catolicismo, Nº 840, Dezembro/2020

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