Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
10 min — há 5 anos — Atualizado em: 2/20/2020, 8:09:46 AM
No dia 20 de fevereiro comemoramos o primeiro centenário da ida para o Céu, com apenas 10 anos, de Jacinta, a mais jovem dos videntes das aparições de Nossa Senhora em Fátima no ano de 1917.
No dia 20 de fevereiro comemoramos o primeiro centenário da ida para o Céu, com apenas 10 anos, de Santa Jacinta de Fátima, a mais jovem dos videntes das aparições de Nossa Senhora em Fátima no ano de 1917.
Tendo Catolicismo publicado em diversas ocasiões matérias sobre Fátima e os videntes, daremos aqui apenas alguns traços da santidade de Jacinta, de quem sua prima, a Irmã Lúcia, afirmou em tom profético: “Tenho esperança de que o Senhor, para glória da Santíssima Virgem, lhe concederá a auréola da santidade. Ela só era criança nos anos, no demais sabia já praticar a virtude e mostrar a Deus e à Santíssima Virgem o seu amor, pela prática do sacrifício […]. É admirável como ela compreendeu o espírito de oração e sacrifício, que a Santíssima Virgem nos recomendou […]. Por estes e outros [fatos] sem conta, conservo dela grande estima de santidade”.[i]
A canonização de Francisco e Jacinta
Francisco e Jacinta de Fátima se tornaram os mais novos santos não mártires da Igreja Triunfante. Qual foi, para a vida da Igreja, a importância dessa canonização? Respondemos com as palavras do Pe. Joaquin Maria Alonso, por ocasião da beatificação deles: “Fátima tem tido tais influências de santidade difundidas pelo mundo e pela Igreja, que seu caráter extraordinário não pode entrar nas leis ordinárias da sociologia em uso. Porque Fátima possui, como talvez nenhum outro carisma da Igreja, o que poderia chamar-se o carisma da atração religiosa. Desde o princípio, Fátima tem atraído os fiéis ao lugar de penitência e oração, sem outros apelos, motivos ou insinuações além dos que procedem de sua Mensagem austera de salvação […]. Os frutos, na conversão dos corações, têm sido espetaculares. Por todas as partes os fiéis se sentem estranhamente comovidos e atraídos aos lugares por onde passa a imagem peregrina, a fazer oração e penitência, pela simples presença da imagem bendita. E este fenômeno não tem precedentes nem explicações sociológicas suficientes”.[ii] A canonização de dois dos três videntes da divina história de Fátima aumentou ainda mais esse interesse e fervor.
Jacinta: piedade precoce
Muito piedosa desde a mais tenra infância, Jacinta nasceu em 11 de março de 1910, há exatos 110 anos. Sua prima Lúcia, que sempre a conheceu, assim se exprime: “Ainda de cinco anos mais ou menos, ao ouvir narrar os sofrimentos do Nosso Divino Redentor, enternecia-se e chorava: ‘Coitadinho de Nosso Senhor. Eu não hei-de fazer nunca nenhum pecado, não quero que Jesus sofra mais’. Se as palavras feias eram pecado, e faziam sofrer o Menino Jesus, a Jacinta fugirá então delas e das companhias entre as quais há perigo de contrair hábito tão mau”.[iii]
Crescendo ela um pouco mais, Lúcia registrou ainda: “A Jacinta tinha um porte sempre sério, modesto e amável, que parecia traduzir a presença de Deus em todos os seus atos, própria de pessoas já avançadas em idade e de grande virtude. Não lhe vi nunca aquela demasiada leviandade ou entusiasmo próprio das crianças pelos enfeites e brincadeiras (isto depois das aparições); não posso dizer que as outras crianças corressem para junto dela como faziam para junto de mim; e isto, talvez, porque ela não sabia tanta cantiga e historieta para lhes ensinar e as entreter, ou então porque a seriedade do seu porte era demasiado superior à sua idade”.[iv]
O convite de Nossa Senhora à santidade
Na primavera de 1916, a vida dos três — antes alegres e despreocupados pastorinhos de apenas nove, oito e seis anos de idade — iria sofrer brusca mudança: “Os corações de Jesus e Maria estão atentos à voz de vossas súplicas”, diz-lhes numa aparição o Anjo de Portugal, o Anjo da Paz. “Oferecei constantemente ao Altíssimo orações e sacrifícios. De tudo o que puderdes, oferecei um sacrifício ao Senhor em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido, e de súplica pela conversão dos pecadores […]. Sobretudo aceitai e suportai com submissão o sofrimento que o Senhor vos enviar”.
Este é um programa de santidade, só pedido aos verdadeiros íntimos de Deus. E os três hão de cumpri-lo à risca e com fervor, sem lamúrias, queixas nem pena de si mesmos, com verdadeira alegria e amorosa submissão. Inventavam até mesmo os mais variados meios de se sacrificar. Assim, aproximadamente um ano depois, estavam prontos para receber a visita da Rainha do Céu. E Ela veio. Não com agrados, não com mimos, mas com seriedade, repetindo logo no primeiro encontro o convite à oração e ao sofrimento, feito pelo Anjo. “Ides pois ter muito que sofrer. Mas a graça de Deus será o vosso conforto”.
Oração e sofrimento em reparação ao Imaculado Coração de Maria e ao Sagrado Coração de Jesus, tão ofendidos pela terrível apostasia da Humanidade. A extensão desse pedido eles só a compreenderiam aos poucos, com o auxílio de uma graça especial. As três crianças levaram muito a sério o pedido da Mãe de Deus, de orarem e se sacrificarem para a conversão dos pecadores.
Jacinta, por ser a menor e a mais sensível dos três pastorinhos, empenhou-se particularmente em atender ao pedido da Virgem. Como pôde ela, tão pequenina, assumir e compreender tão profundamente o espírito de mortificação e penitência? Lúcia responde: “Primeiro, por uma graça especial que Deus, por meio do Imaculado Coração de Maria, lhe quis conceder; segundo, vendo o inferno e a desgraça das almas que ali caem”. Comenta o já citado Pe. Alonso: “Diante de Jacinta, a própria Lúcia sentia o que de ordinário se sente junto a uma pessoa santa, que em tudo parece comunicar-se com Deus […]. A vista do inferno a havia horrorizado a tal ponto, que todas as penitências e mortificações lhe pareciam nada, contanto que conseguisse livrar dali algumas almas”.[v]
Fenômenos místicos, bilocação
Não é de admirar que Jacinta fosse obsequiada por várias graças místicas. Teve visões proféticas, obteve curas e graças consideradas milagrosas, e conta-se dela também um fato de bilocação, em cujo relato seguimos o Pe. Ayres Ferreira:
O filho de uma família aparentada com a dos os Martos fugiu de casa, sem que se soubesse seu paradeiro. A “tia Vitória”, como era conhecida a mãe desse do rapaz, pediu a Jacinta que rezasse por ele. Dias depois o jovem reapareceu e pediu perdão aos pais. Contou que, depois de ter gastado o que roubara, fora detido como vadio e metido na cadeia. Certa noite, durante um temporal, ele conseguiu evadir-se, mas se perdeu no meio de num pinheiral. Tomado de terror, caiu de joelhos e começou a rezar. Nesse momento Jacinta lhe apareceu, pegou-o pela mão e o deixou em uma estrada,fazendo sinal para que continuasse a percorrê-la. Ao amanhecer, encontrou-se num local que logo reconheceu, e assim foi ter à casa paterna. Interrogada sobre o fato, Jacinta respondeu que nem conhecia o tal pinheiral, e que só se limitara a rezar pelo infeliz.[vi]
Jacinta e os Sagrados Corações de Jesus e Maria
Certo dia Lúcia deu a Jacinta uma estampa do Sagrado Coração de Jesus, que julgava bastante bonita. Jacinta a pegou, olhou-a com atenção, e exclamou: “É tão feio!… Não se parece nada com Nosso Senhor, que é tão bonito. Mas quero; sempre é Ele”. E constantemente o trazia consigo; de noite e na doença, colocava-o debaixo do travesseiro; beijava-o frequentemente, e dizia: “Beijo o Coração, que é o de que mais gosto. Quem me dera [obter] também o Coração de Maria, para ter os dois juntos!”[vii]
Com efeito, a missão reparadora de Jacinta vai intimamente ligada ao Coração Imaculado de Maria. Quando Nossa Senhora mostrou o inferno aos três pastorinhos, disse-lhes: “Vistes o inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores; para salvá-las, Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração”. Jacinta foi uma missionária dessa devoção.
Por isso, ao despedir-se de Lúcia antes de partir para Lisboa, e depois para o Céu, recomendou-lhe veementemente: “Tu permaneces aqui para dizer que Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao Imaculado Coração de Maria. Quando tiveres que dizer isto, não te escondas”. E acrescentou: “Diz a todo o mundo que Deus nos concede as graças por meio do Coração Imaculado de Maria. Que se peça a Ela. O Coração de Jesus quer que, a Seu lado, se venere o Imaculado Coração de Maria. Que peçam a paz ao Imaculado Coração de Maria; Deus a entregou a Ela. Oh! Se eu pudesse meter no coração de todo mundo o fogo que tenho aqui dentro do peito, queimando-me e fazendo-me gostar tanto do Coração de Jesus e do Coração de Maria!”[viii]
Pelo relatório oficial do Prior da freguesia de Leiria, acabado no mês de agosto de 1918 e entregue à Autoridade Eclesiástica em 28 de abril de 1919, sabemos que Nossa Senhora apareceu particularmente a Jacinta, pelo menos três vezes, no curto espaço de outubro de 1917 a agosto de 1918.[ix]
O impressionante calvário de Jacinta
No dia 23 de dezembro de 1918, Francisco e Jacinta adoeceram gravemente, atacados pela terrível epidemia bronco-pneumônica [conhecida no Brasil como gripe espanhola] que tantas vítimas fazia então por toda a Europa. Pelo mesmo tempo caiu doente toda a família, exceto o pai que, assistido por pessoas caridosas, se tornou um desvelado enfermeiro.
Atingidos pela doença, os dois inocentes não perderam em nada seu fervor pelos sacrifícios, mas as ocasiões agora se multiplicavam, sem que as tivessem de procurar. Depois da piedosa morte de Francisco, começou o terrível calvário de Jacinta. Nossa Senhora perguntou a se queria ficar um pouco mais na Terra, para sofrer pela conversão dos pecadores. A generosa criança respondeu que sim. Com isso foi para dois hospitais em Lisboa, onde muito sofreu e acabou morrendo sozinha, afastada dos parentes. Mas Nossa Senhora não a deixou só. Aparecia-lhe frequentemente, instruindo-a, aconselhando-a, alertando-a sobre a situação do mundo e a iminência dos castigos.
A Madre Maria da Purificação Godinho, a quem Jacinta fazia suas confidências, anotou muitas das comunicações celestes e meditações da jovem pastorinha, as quais constam em vários livros e revelam o grau de maturidade espiritual a que chegara essa menina de menos de 10 anos.
Jacinta já fora operada uma segunda vez em fevereiro de 1920. Devido a seu estado de fraqueza, só puderam utilizar clorofórmio e anestesia local. Chorou muito, ao ver que estava sendo tratada pelos médicos despida de suas roupas. Retiraram-lhe duas costelas, deixando um orifício tão grande que por ele se podia atravessar uma mão. Ela sofreu tudo caladinha, só gemendo às vezes: “Ai, minha Nossa Senhora!”. Mas, para consolar os que a viam sofrer, dizia: “Paciência! Todos temos que sofrer para chegar ao Céu”.
Comenta o Pe. Alonso: “O Senhor uniu Jacinta à sua Paixão dolorosa e às dores da Virgem do modo mais íntimo. E todas as graças de consolo que recebeu, das várias visitas de Nossa Senhora, não foram impedimento para que essa Paixão acerba tocasse os limites do martírio mais horrível. Diríamos que, para ser modelo de vítima reparadora, Jacinta teve que passar por todas as noites dos sentidos, e também do espírito, sofrendo aquela temível solidão que ela tanto temia”.[x]
Na Sexta-feira, 20 de fevereiro de 1920, Nossa Senhora veio buscar Jacinta. Apesar de não ter completado 10 anos, já estava plenamente madura para o Céu.
[i] “Contribuição de memórias pessoais para a biografia da pequenina Jacinta”, Irmã Lúcia, apud Pe. Luís Gonzaga Ayres da Fonseca S.J., Editora Vozes Ltda., Petrópolis, quinta edição, 1954, Prólogo.
[ii] Joaquin Maria Alonso, Doctrina y espiritualidad del mensaje de Fátima, Arias Montano Editores, S.L., Madrid, 1990, p. 333, 334.
[iii] Pe. João De Marchi, I.M.C., Era uma Senhora mais brilhantes que o Sol…, Seminário das Missões de Nossa Senhora de Fátima, Cova da Iria, 4ª edição, 1954, p. 39.
[iv] Id. p. 215.
[v] Pe. Alonso, pp. 133, 134.
[vi] Apud Pe. Luís Gonzaga Ayres da Fonseca S.J., Editora Vozes Ltda., Petrópolis, 5ª edição, 1954, p. 141.
[vii] Id. p. 145.
[viii] Apud Pe. Alonso, 143.
[ix] Cfr. Relatório oficial do Prior da freguesia de então, acabado no mês de agosto de 1918 e entregue à Autoridade Eclesiástica em 28 de abril de 1919, in Pe. Luís Gonzaga Ayres da Fonseca, op. cit.
[x] Op. cit., p. 144.
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