Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
8 min — há 10 anos — Atualizado em: 9/1/2017, 8:51:22 PM
A comunidade islâmica instalada no âmago do País é a grande preocupação dos franceses. Uma parte deles veem no Islã o principal inimigo, outra se ilude com um tipo de islamismo moderado. Tal problema se acrescenta ao conflito pré-existente entre os princípios da Revolução Francesa e a França católica, aureolada de glórias do passado e com a promessa de um futuro grandioso.
A propósito do ataque terrorista perpetrado contra um tabloide satírico no dia 7 de janeiro em Paris, o colunista Ross Douthat, da revista dominical do “The New York Times”, publicou três dias depois um interessante artigo intitulado France, the Crucible of Europe, o qual foi traduzido pelo jornal “Estado de S. Paulo” (13-1-15) como França, síntese da Europa. Tal tradução a meu ver distorce um pouco o sentido, pois “crucible” em inglês não é propriamente síntese, mas ponto crucial. Ou seja, o lugar estratégico onde se decide o futuro.
Logo no início, Douthat salienta uma realidade: a vítima desse ataque é uma França que se preocupa há décadas, e mesmo séculos, com o seu próprio declínio. “Mas, apesar desses temores, a França não é um país irrelevante ou sem forças. Pelo contrário, ela está se tornando cada vez mais importante e mais crucial para o futuro da Europa e do Ocidente. Não! A era do Rei Sol não retornará. Mas política, cultural e mesmo intelectualmente, os eventos na França nos próximos 50 anos poderão ser mais importantes do que antes das duas guerras mundiais”.
Hoje, entretanto, o principal inimigo da França não é um rival europeu como a Inglaterra ou a Alemanha; nem os Estados Unidos, que invadiram o Ocidente com a sua cultura hollywoodiana. Seu maior inimigo é o Islã, que logrou introduzir-se por toda parte no próprio território francês, que abriga a maior população muçulmana entre todos os países europeus.
“Partes dessa população estão mais assimiladas do que em qualquer outra parte da Europa”, acrescenta o jornalista. Porém, “16% dos cidadãos franceses apoiam o Estado Islâmico, segundo uma pesquisa realizada no ano passado”.
Essa porcentagem é assustadora e explica por que a resposta ao islamismo está dividida: “Os muçulmanos são vistos de modo mais favorável na França do que em qualquer outra região da Europa ocidental”, afirma Douthat.
Realmente, os muçulmanos foram aquinhoados com dádivas generosas por parte dos partidos franceses, de esquerda como de direita. O governo Mitterrand (socialista) deu-lhes de presente um luxuoso e caríssimo Instituto do Mundo Árabe, na parte central de Paris. Por toda a França ergueram-se nos últimos anos mesquitas e institutos muçulmanos com o apoio financeiro do Estado francês.
Por outro lado, décadas de pregação do ecumenismo por parte da Hierarquia católica tiveram como resultado uma espécie de desarme dos fiéis diante dos partidários da djihad, a guerra “santa” do Islã. O principal argumento desses ecumênicos é que nem todos os muçulmanos são radicais e por isso os católicos deveriam ser compreensivos para com os “moderados”. A matança de monges de Tibhirine, na “moderada” Argélia, em 1996, mostra como essa visão distorcida da realidade pode esconder um incentivo ao velho inimigo dos cristãos, que odeia particularmente os franceses enquanto descendentes dos cruzados. Na realidade, nem o Corão nem a História demonstram ser confiável a moderação que os partidários do ecumenismo lhes atribuem.
De qualquer forma, tem razão o jornalista do “The New York Times” ao pôr no centro da questão a dúvida sobre a capacidade dos Estados europeus de integrar os imigrantes muçulmanos, bem como sobre o que poderá acontecer se isso não for possível. Desse ponto de vista, é de se temer um futuro bastante preocupante para a Europa, pois a aceitação de uma integração dos muçulmanos pode ir de par com uma apostasia geral dos europeus.
É preciso, por outro lado, não confundir a origem étnica com a religião. Muitos descendentes de árabes e sírio-libaneses que vivem no Ocidente provêm de imigrações católicas e são recebidos com todo carinho e caridade cristã. Os brasileiros compreenderão perfeitamente do que falo. A colônia sírio-libanesa de São Paulo é das mais ricas e tradicionais da capital paulista. O mesmo se observa na França e em outros países da Europa, mas não são esses imigrantes que estão em questão na presente análise. Não se deve confundir religião com racismo.
Para ser bem claro, a preocupação é com islamitas que se instalam na Europa através de redes islâmicas cujo objetivo é doutrinar e arrastar para o fanatismo a maioria dos muçulmanos, especialmente os jovens.
Em sua análise, Ross Douthat ressalta a liderança demográfica da França, sobretudo diante da Alemanha, que envelhece. É preciso não exagerar esse aspecto, mas sem dúvida de uns anos a esta parte as gerações mais novas de católicos assumiram com mais responsabilidade a importância da família. E hoje veem-se muito mais crianças nas ruas do que em décadas passadas do século XX. Por outro lado, a influência dos católicos fiéis à liturgia tradicional cresceu e impôs-se num panorama antes dominado pelos “progressistas”, cujas fileiras vão se esvaziando… porque seu “apostolado” ecumênico foi negativo!
Os muçulmanos, como se sabe, admitem a poligamia. Muitos deles vivem na França com várias mulheres. E a elas o Estado francês concede pensão, permitindo que o muçulmano polígâmo viva sem trabalhar, à custa das pensões que suas mulheres recebem! Por isso os postos de seguridade social e de assistência médica estatais estão frequentemente lotados de mulheres muçulmanas, que fazem questão de usar os seus véus característicos.
Pela mesma razão, em geral os muçulmanos têm muitos filhos, por conta da seguridade social francesa. Talvez isso tenha seu peso no fato de a França liderar o número de nascimentos entre os países mais importantes da Europa, com uma taxa demográfica de 2,1 a 2,2 nascimentos por mulher. Na realidade, esta é a taxa mínima para garantir o crescimento, também mínimo, de um país. Mas muitas nações católicas europeias, como Portugal e Polônia, não vão além de 1,2 ou 1,3 nascimentos por mulher… É doloroso! E também leva a perguntar o que fizeram os bispos e sacerdotes de tais países para evitar esses verdadeiros suicídios nacionais.
Curiosamente, a laicidade imposta aos franceses pelos socialistas e outros partidos políticos tem favorecido a expansão do islamismo, em prejuízo da população católica. Por outro lado, a crise progressista na Igreja agrava essa situação contra a qual milhares de católicos vêm se levantando nos últimos anos, para desagrado de muitos bispos que pregam um ecumenismo às cegas com os muçulmanos.
Na interessante análise de Ross Douthat figuram vários outros pontos que mereceriam ser comentados. Mas isso tornaria demasiado longo este artigo. Limito-me, pois, ao papel de liderança da nação primogênita da Igreja. Infelizmente ela muitas vezes foi infiel. Basta lembrar que a França atual é filha da Revolução de 1789. Mas nela também existem filões que vêm de Clóvis, de São Luís, dos católicos ultramontanos do século XIX.
“Se existe alguma coisa que poderá sacudir o Ocidente do seu atual torpor de final de um ciclo histórico, algum novo conflito ou síntese ideológicos, isso deverá ocorrer primeiramente no lugar onde tantas revoluções nasceram”, afirma o colunista americano. E continua: “A França sempre foi o país dos extremos — absolutista e republicana, católica e anticlerical, comunista e fascista. Agora, mais uma vez, é o lugar onde forças robustas estão colidindo e onde as incertezas culturais, sobre o Islã, o secularismo, o nacionalismo, a Europa, e a própria modernidade — sugerindo que novas forças em breve surgirão”.
Em outros termos, a França é um país providencial. E isto pode criar surpresas nos planos daqueles que se fundam em meros raciocínios humanos. Douthat conclui: “O declínio é real, mas o futuro não está escrito. Se a Europa ainda se tornar palco de transformações históricas, para o bem ou para o mal, isso ocorrerá em primeiro lugar na bela França”.
Auguremos que tal se dê para o bem, sob os auspícios daquela que é a verdadeira Rainha da França: a Santíssima Virgem Maria, que em tantas aparições (Lourdes, Rue du Bac, La Salette, Pellevoisin e outras) tentou sempre guiar essa nação nas vias da civilização cristã. É preciso ressaltar que, apesar de seus crimes, a França conserva aspectos e veios de fidelidade difíceis de encontrar em outro país. Daí a sua beleza, fruto da Cristandade.
Sirvo-me das palavras inspiradas de São Pio X na alocução consistorial Vi ringrazio, de 29-11-1911, para concluir:
“Dia virá — e esperamos que não esteja longe — em que a França, como Saulo no caminho de Damasco, será envolvida por uma luz celeste e ouvirá uma voz a clamar: Minha filha, por que me persegues?
“E à sua resposta: — Quem és, Senhor? A voz replicará:
“— Eu sou Jesus, a quem tu persegues. É duro para ti recalcitrar contra o aguilhão, porque em tua obstinação tu te arruínas a ti próprio.
“E ela, trêmula e admirada, dirá:
“— Senhor, que quereis que eu faça?”
Que a Santíssima Virgem reconduza assim a França, Filha primogênita da Igreja, às vias da conversão e da fidelidade total, nesta época de tanta apostasia.
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