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Plinio Corrêa de Oliveira
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Liberdade religiosa – I


Nilo Fujimoto

Manifestastes na praia de Copacabana. Foto: Marco António Cavalcanti – O Globo

Ao exemplo do que ocorre com milhões de internautas, procuro manter-me informado através da Internet do que acontece no País e no mundo. Muitas vezes, contudo, matérias que lemos suscitam reflexões e levantam dúvidas sobre como analisá-las.

Foi o que aconteceu com a seguinte notícia, divulgada pela UOL: “Cinco mil pessoas fazem caminhada no Rio para defender liberdade religiosa”.

Como entendê-la? Pesquisando, encontrei um esclarecedor artigo do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, que dividi em duas partes e ofereço à consideração do leitor. Mas lhe recomendo ler antes a notícia da UOL.

O que me levou a pensar sobre a questão da liberdade religiosa foi o seguinte trecho: “Praticantes de Wicca (religião neopagã influenciada por crenças pré-cristãs) também denunciam a intolerância, durante a manifestação.

De acordo com a veterinária Shirley Ribeiro, de 32 anos, o preconceito contra as bruxas ainda é flagrante. ‘Não podemos dizer que somos bruxas. Muitas pessoas, especialmente os cristãos, olham para a gente achando que fazemos coisas ruins’, afirmou.”

Inclusive eu, mas por razões doutrinárias. Se a “Comissão de Combate à Intolerância Religiosa” bater à porta de minha casa, como vou me defender?

A ciência e o indiferentismo religioso

O “Legionário” n.º 61, 13 de julho de 1930

Procuraremos evidenciar, no presente artigo, que não se admite cientificamente que o Estado seja agnóstico ou indiferente em matéria religiosa. Sustentaremos que se compreende o Estado ateu, o Estado protestante, ou o Estado judeu, tanto quanto o católico. O que não se compreende é o Estado agnóstico, indiferente, tal qual o fez nossa Constituição de 1891.

Para estudar convenientemente a questão, alinhemos primeiramente os argumentos que temos em nosso favor. São eles os seguintes:

I – é indispensável que o Estado assuma uma atitude qualquer, católica ou não, em face do problema religioso;
II – desta atitude resultam grandes vantagens para o Estado;
III – também a Igreja Católica tem muito a ganhar com este estado de coisas. E, como ela, todas as demais igrejas.

Uma vez demonstradas estas premissas, chegaremos ipso facto à conclusão que constitui nossa tese.
Abordemos, pois, a defesa do primeiro dos argumentos.
O Estado tem por fim a felicidade geral. É esta uma afirmação científica que não suscita divergências, nem admite contestações.

Ora, se o Estado quiser preencher seu fim, e trabalhar eficazmente para a felicidade coletiva, deve ele procurar a felicidade segundo a entende a coletividade ou ao menos a maioria, dentro dessa coletividade.
Tanto é isto verdade que, até hoje em dia, existe a tendência de sujeitar os destinos das nações aos votos da maioria.

Qual a razão de ser desta tendência? É o conceito de que o Estado deve procurar a felicidade geral, segundo o desejo da generalidade, ou da maioria dos indivíduos que o compõem. É este o fundamento do sistema representativo, hoje universalmente adotado.

Ora, é indiscutível que a concepção de felicidade varia segundo a posição que cada indivíduo assume em face da questão religiosa.

Realmente, o católico acha que contribui para a felicidade geral o guardar os Dias Santos e domingos, porquanto, embora diminuam, com isto, seus lucros, terá como a maior das recompensas as bênçãos do Senhor para o seu trabalho. Daí, o entender que o governo deve decretar feriados nos Dias Santos de Guarda.

O acatólico, pelo contrário, entende que apenas se deve guardar o domingo por ser de vantagem um certo repouso. Quanto a não trabalhar em outros dias, representa isto uma diminuição de lucros, absolutamente injustificável diante dos interesses econômicos gerais.

Um pai de família católico entende que a felicidade da nação só será assegurada convenientemente se, a par da instrução científica, os meninos receberem instrução religiosa e, partindo deste conceito, entende que o Estado, em sua tarefa de procurar o bem geral, deve ministrar em suas escolas o ensino religioso.
Já um pai ateu, partindo, por exemplo, das excelências que julga descobrir na moral leiga, deseja uma solução diametralmente oposta.

Em uma palavra, se se estabelece que a vida presente nada é senão uma antecâmara da eternidade, está ipso facto estabelecido que a felicidade presente e transitória se deve subordinar ao supremo interesse da felicidade eterna.

Se se estabelece, porém, que temos uma só vida, a concepção de felicidade sofre radical modificação e, com ela, se altera a orientação geral do Estado.

Ora, vimos que o Estado só preencherá seu fim no dia em que o fizer de acordo com o conceito que a generalidade de seus cidadãos forme sobre a felicidade que ele, Estado, deve promover.

Logo, está demonstrado [ser] inadmissível que o Estado que não se proclame ateu, não oficialize a religião [adotada pela grande maioria de seus] membros, desde que esta maioria seja católica, protestante etc.
De fato, como acabo de salientar, é profunda a diferença que existe entre as concepções de felicidade coletiva dos diversos indivíduos, e esta diferença é quase sempre causada por suas divergências em matéria religiosa.

Assim, o católico é defensor vigilante do direito de propriedade, porque a legitimidade deste direito é defendida por sua Igreja.

Um protestante, que se dota a si próprio da liberdade de interpretar a Bíblia, pode, pelo contrário, entender que certas restrições, ou mesmo a própria eliminação do direito de propriedade são perfeitamente admissíveis. Daí o entender que se deve preparar a nação para uma lenta evolução para o comunismo reclamado pelas massas.

Um ateu, atendendo a que a propriedade, para quem não crê em Deus, pode ser abolida, entende que a propaganda comunista pode ser perfeitamente tolerada pelas leis. Daí o julgar que se devem, por exemplo, reatar as relações comerciais com os soviets, independentemente do perigo de uma infiltração comunista que, para o católico, é mal maior do que qualquer benefício comercial que daí possa advir.

Logo, no homem de Estado que dirige uma nação, fala constantemente o crente ou o descrente. Se o Estado fechar os olhos ao problema religioso, não poderá ele proporcionar a felicidade à maioria, pois que, enquanto o Estado busca um ideal independente de qualquer solução em matéria religiosa, não pode atingir a felicidade ambicionada pela maioria, felicidade esta subordinada, toda ela, a uma concepção religiosa ou irreligiosa qualquer.

Logo, o Estado agnóstico, indiferente, como o Brasil de hoje, não se admite cientificamente.
Admite-se, isto sim, o Estado protestante, judeu ou ateu, tanto quanto o católico. O que não se compreende é o Estado indiferente.

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