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Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo

TEM UMA PEDRA NO CAMINHO

Por Péricles Capanema

7 minhá 5 anos — Atualizado em: 1/27/2020, 9:14:58 PM


Tem uma pedra no meio do caminho. Drummond — que aliás qualificou o verso famoso de “texto insignificante, um jogo monótono” — na verdade escreveu “tinha uma pedra no meio do caminho”. Podia ser que já não mais lá estivesse. Eu, por meu lado, não estou tratando do passado, refiro-me a presente candente, agora tem uma pedra grande no meio do caminho. Trata-se de tirá-la da frente.

Vamosaos fatos. O Dr. Salim Mattar, secretário-especial de Desestatização eDesinvestimento, em 14 de janeiro afirmou, ao longo de 2020 o governo pretendearrecadar com privatizações, vendendo uns 300 ativos, em torno de R$150 bilhões.Aplausos, o caminho para a prosperidade passa pela desestatização; de outromodo, pela privatização.

Informoua mais o dirigente, a Caixa, o Banco do Brasil e a Petrobrás não serão tocados.Os Correios ficaram para fins de 2021. Anunciou ainda, a maior parte dodinheiro arrecadado virá de desinvestimento (vendas) no sistema Eletrobrás. Emsuma, enorme programa de privatização em curso; para torná-lo mais ágil serãoencaminhados projetos de lei à Câmara dos Deputados, asseverou o Dr. Salim.

Repitoo que escrevi, para mim, em princípio, quanto mais ampla a privatização,melhor. O particular tem mais eficácia que o burocrata quando o assunto écontratar, comprar, vender e produzir. No fim, com a economia na mão departiculares e não do Estado, teremos produtividade maior; enfim, mais empregoe renda, o que favorece o bem comum. E que o Estado execute bem o que lhe épróprio, regulações, defesa, segurança, proteção da moeda, atenção especial aosmais carentes, alguma coisa mais, tem valioso e insubstituível papel. É aaplicação do princípio da subsidiariedade nas relações entre a sociedade e oEstado, entre o particular e o estatal. Paro, e até peço desculpas, estou mesentido um pouco o conselheiro Acácio.

Agora,com licença do Eça, dou as costas ao conselheiro, e trato de assuntos que nãosão (ou não parecem) óbvios, ênfase em matéria constitucional.

Aolongo de 2020, aposta minha, o leitor escutará até o fastio as seguintesexpressões: empresários chineses, empresas chinesas, investimentos chineses,investidores chineses. Não acredite. É mentira deslavada. Melhor, fraudeescandalosa para esconder a realidade (conhecida, aliás, do Brasil inteiro, masmisteriosamente silenciada). Vou explicar.

Dizia Talleyrand,“boutade”dele, uma a mais, a palavra nos foi dada para dissimular o pensamento (hávariadas versões do que ele teria de fato afirmado, todas em torno da ideia deque a palavra mais serviu para disfarçar do que para exprimi-lo). É o nossocaso, a dissimulação. Mais no ponto, dissimular para ocultar a verdade inteira.

Voltoao que dizia e explico. À vera, as empresas chinesas que investem no Brasil sãona maioria esmagadora dos casos, para ser prudente, estatais chinesas —dirigidas dos pés à cabeça, por dentro e por fora — pelo governo chinês, oqual, por sua vez, não nos esqueçamos temos lá governo de partido único, édirigido pelo Partido Comunista Chinês (PCC). Os empresários chineses quetransitam no Brasil (conto da carochinha) são na verdade burocratas, membros bemvistos e bem vestidos do PCC, com cargos de direção nas estatais. Os tais investidoreschineses que aplicam no Brasil, outro recurso ardiloso, na verdade não existem;é dinheiro posto aqui pelo governo chinês, dono das estatais.

Então,a bem da transparência, fica aqui a errata. Quando você ler empresas chinesas,leia empresas estatais chinesas. Quando ler, empresários chineses, leia burocrataschineses. Quando ler investidores chineses, leia aplicações do governocomunista chinês via estatais. Quando ler investimentos chineses, leiaaplicações do governo chinês, dirigido pelo PCC. Não vai errar em, por baixo,99,9% dos casos.

O que estoubradando em cima dos tetos — proclamai-o do alto dos telhados, obrigaçãoevangélica (Mt 10, 27) — é proibido divulgar desse jeito (mas todo mundo sabeque é assim). Todo mundo vai continuar a falar de empresários chineses, de investidoreschineses, de capitais chineses, de empresas chinesas. Você, minha dica, apliquea errata, pois na prática está proibido mudar tal linguagem. De onde vem aproibição, que apunhala a realidade? Não sei. Mais, pedaço grande do programade privatização brasileiro corre o risco de cair nas mãos de estatais chinesas(parte já caiu). Um exemplo entre dezenas, a imprensa nos últimos dias noticiouque a SABESP, 28 milhões de clientes, onde o governo tem 50,3% do capitalvotante, poderá ser vendida. A quem? Repito o que li: a empresários chineses, aempresas chinesas, a grupos chineses. Dissimulação. Qual a empresa interessadanum negócio que pode chegar a R$40 bilhões ou mais? Só um nome, ChinaRailway Construction Corporation, estatal chinesa. Privatização àbrasileira.

Não souconstitucionalista e, por isso, solicito auxílio deles. Mas me surpreenderia senão estivéssemos diante da maior agressão à Constituição da história brasileira— monstruosa, aberrante, silenciada e silenciosa.

Adiante,escrevendo preto sobre o branco. Comanda o artigo 173 da Constituição:

“Ressalvadosos casos previstos nesta Constituição, a exploração direta da atividadeeconômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos dasegurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos emlei”.

Aexploração direta da atividade econômica pelo Estado se dá por meio de empresaspúblicas e empresas de economia mista (estatais). O Estado brasileiro estáproibido de agir diretamente na esfera econômica salvo nos dois casos acima.Logo, seria aberrantemente ilegal que o Banco do Brasil, a Caixa, a Petrobrás,entre outros agentes econômicos, via de regra (sempre se pode pensar empequenas exceções), participassem do processo de privatização. Seriam atosinconstitucionais, nulos.

Se aoEstado brasileiro é vedado participar do processo de privatização no Brasil, a fortiori os Estados estrangeiros estãoimpedidos de fazê-lo por meio de suas estatais. É absurdo, de fato, entre nós,muitas vezes, para privatizar, a propriedade sai das mãos do Estado brasileiroe vai para as mãos de Estado estrangeiro. Na prática, contudo, estamos tendo a presençagigantesca de estatais de outros países no processo de privatização do Brasil. Enão só de estatais chinesas. Tais atos não foram nulos por inconstitucionais?

Quandovocê ler fundo soberano de tal país, entenda estatal de tal país, outraexpressão para a errata. Vários fundos soberanos (estatais) estão ativos noBrasil, tentando aproveitar as oportunidades do processo de privatização. Umexemplo, poucos dias arás, foi feita a concessão (uma forma de entrega àiniciativa privada) do trecho Piracicaba-Panorama. O consórcio vencedor,Consórcio Infraestrutura Brasil, é formado pelo fundo Pátria e pelo fundo soberanoGIC (fundo soberano de Singapura). Foi a maior concessão até hoje feita. O GICé uma estatal de Singapura. Vedado ao Estado brasileiro, mas permitido aSingapura, um Estado soberano? Pode?

Aquiestá, tudo o indica, o argumento falacioso por trás dos investimentos degovernos estrangeiros no Brasil: todas essas aplicações de capitais estão sendoabrigadas, por desídia e velhacaria (é impostura, e ela continua intacta) noartigo 172 da Constituição:

“Alei disciplinará, com base no interesse nacional, os investimentos de capitalestrangeiro, incentivará os reinvestimentos”.

Capitalestrangeiro, o ponto. Mas não estamos diante apenas de capital estrangeiro, nãoestamos tratando apenas de investimentos estrangeiros. É falsidade ululanteparar por aí. Vamos colar nos fatos. Estamos diante de capital estrangeiroestatal, óbvio ululante, para uma vez mais lembrar Nelson Rodrigues. Sãogovernos os seus proprietários. E nesse caso, vale o artigo 173: se há vedaçãoconstitucional para o Estado brasileiro estar presente, muito menos poderá oEstado estrangeiro investir por meio de empresas públicas, sociedades deeconomia mista ou fundos soberanos. Claro como água de pote.

Seassim não fosse, o Estado brasileiro na obediência ao artigo 172 não poderiaser proprietário por vedação constitucional, mas, por absurdo, a Constituiçãoestimularia que, nas mesmas circunstâncias, Estados estrangeiros abocanhassem taispropriedades.

Nãoadianta chiar, estamos diante de problema constitucional grave, nulidade deatos há anos sucedendo no ordenamento jurídico nacional. Martelo, não estamos tratandode investimentos estrangeiros, é falsa a afirmação, estamos falando deinvestimentos estatais de Estados estrangeiros. Aqui está o problema.

Oproblema está aqui, mas não está só aqui. Vai mais longe. A atividade econômicano Brasil obedece a princípios, comanda o artigo 172, o primeiro dos quais(inciso I) é que não pode lesar a soberania nacional. Nem real, nempotencialmente. Pergunto, os investimentos maciços de estatais chinesas noBrasil que em nada, só por chacota, poderiam ser “imperativos de nossa segurança nacional” não ameaçam a segurançanacional? A presença crescente deles na infraestrutura tem “relevante interessecoletivo”? Ligarmos nossa economia, que passará a ter um de seus pontosnevrálgicos em Pequim, na sede do PCC, tão íntima e fortemente a um podermundial imperialista e ditatorial em nada arranha a soberania? Poder que hoje, vistocom simpatia pela esquerda interna entreguista, apoia ditaduras como Irã,Coreia do Norte, Venezuela, Cuba. É nosso futuro, sem dúvida de retrocesso eatraso, adversário dos direitos humanos?

Umúltimo ponto, a Constituição determina, artigo 172, a lei disciplinará, combase no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro. Fala emcapitais privados, é claro; refere-se também a capitais públicos. É dointeresse nacional termos gigantescas presenças na economia de Estadosestrangeiros, em especial da China comunista?

Paropor aqui e faço convites cordiais. Os constitucionalistas precisam sepronunciar, também é imprescindível que falem os setores que por missãoinstitucional ou presença na vida pública estão especialmente ligados àpreservação e defesa da independência nacional, assim como de nossos interessesestratégicos. Tem uma pedra no meio do caminho. Uma, não; várias, grandes ecortantes.

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Péricles Capanema

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184 artigos

Analista político e colaborador do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira

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