Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
4 min — há 9 anos — Atualizado em: 9/1/2017, 8:49:57 PM
Alexandre Semedo de Oliveira (*)
O debate sobre a redução da maioridade penal segue vivíssimo em solo pátrio, tendo se inflamado ainda mais nos últimos dias em virtude da trágica morte de um ciclista na cidade do Rio de Janeiro/RJ. Segundo as informações que nos chegam, o principal suspeito do crime é um menor de idade que já tinha 14 (!) passagens por atos infracionais, cinco delas por roubos com facas. Por tais atos infracionais, o menor ficou ao todo algo como sessenta dias em unidades de internação, sendo impossível não se gerar, tanto no espírito do próprio adolescente quanto no da sociedade em geral, a certeza de que atos infracionais passam como que impunes no Brasil, por mais graves que sejam.
Dado o recrudescimento deste debate, o “verdadeiro exército do contra” (que, neste caso, é contrário, obviamente, à redução da maioridade penal) já tem um argumento pronto. Trata-se de um verdadeiro (na opinião deles) tiro de canhão, capaz de destruir a posição contrária e encerrar o debate. Trata-se do argumento do “não resolve”, que invariavelmente brota na boca de todos os contrários à redução. Uma vez que (como dizem) a redução da maioridade penal não resolveria o problema da delinquência juvenil, é inútil reduzi-la.
O argumento é invencível. É, mesmo, irrefutável. É logicamente perfeito.
Só há um problema com ele: o argumento do “não resolve”, pura e simplesmente, não se aplica à discussão. Pois, ao menos até onde eu saiba, ninguém defende a redução da maioridade penal para “resolver” o problema da delinquência entre nossos jovens. Ao contrário, defende-se tal redução porque punir adolescentes pelos atos bárbaros que cometem é um imperativo da justiça, que teria ainda, como efeito colateral desejável, uma redução no índice de criminalidade entre os adolescente.
Voltemos à realidade por um instante.
Como todos sabem, matar é crime (isto é, ao menos para quem tem mais de 18 anos…). E, no entanto, a criminalização do homicídio nem de longe resolve o problema de algumas dezenas de milhares de homicídios praticados no Brasil a cada ano. Aplicando-se a lógica do argumento do ‘não resolve”, poder-se-ia pleitear a completa abolição do crime de homicídio, visto que a punição na esfera criminal dos homicidas não tem resolvido o problema.
O mesmo vale para qualquer outro crime. Estupros, roubos, estelionatos e atos de corrupção são praticados diariamente no Brasil. Se aplicássemos a lógica do “não resolve”, poderíamos pleitear, então, que roubadores, estupradores, estelionatários e corruptos, pura e simplesmente, passassem a receber tratamento equiparável ao dos menores de 18 anos que praticam atos infracionais graves: alguns dias em unidades estatais de reabilitação, um bom passar de mãos na cabeça e retorno imediato ao convívio social.
Alguém entre os “do contra” aceitaria esta conclusão, que logicamente brota do argumento do “não resolve”?
Na verdade, o que se visa com a redução da maioridade de penal é que adolescentes que pratiquem tais atos sofram as consequências justas advindas de tal prática. E a luta pela justiça nestes casos é uma que, em si, vale a pena ser travada.
Isto, por si só, já basta para afastar completamente o argumento do “não resolve”. Mas gostaria, ainda, de tecer duas rápidas considerações.
Primeiramente: uma vez que um crime é, substancialmente, uma opção moral equivocada, a resolução parcial do problema da criminalidade passa pelo resgate da família tradicional e da moral judaico-cristã, que até há algumas décadas era transmitida de pai para filho. Tal tarefa exige um empenho de longo prazo e, francamente, não me parece que o pessoal do “do contra” esteja muito interessado em ocupar-se dela. E, mesmo se vier a ser bem sucedida, dada a natureza do ser humano, ela jamais conseguirá eliminar de todo a criminalidade (resolvendo o problema), pois homens maus sempre existirão.
Por outro lado, a curto prazo, é necessário endurecerem-se as leis penais e o aparelho de repressão ao crime, pois o medo de uma possível e provável punição ainda é, e sempre será, um forte argumento para que se freiem tendências criminosas nas pessoas.
E, em segundo lugar, se é verdade que a redução da maioridade penal “não resolve” o problema, não é menos verdadeiro que o sistema atual nada tem feito para resolvê-lo. O fracasso da ideia de impunidade para com os jovens delinquentes é visível mesmo para o cidadão de pouco estudo. Todos veem os efeitos deletérios desta política aplicada há décadas.
Assim, ainda que, no extremo, o pessoal do “do contra” esteja certo em suas análises quanto ao fracasso possível do endurecimento da resposta estatal aos adolescentes infratores, estar-se-ia trocando um fracasso certo e já concretizado por um outro meramente hipotético, ainda que provável.
E tal troca, convenhamos, é, em si mesma, um bom negócio.
Restaria, ainda, tratar o segundo argumento que o pessoal do “do contra” costuma utilizar no debate travado em torno da redução da maioridade penal: o argumento do “por que parar nos dezesseis?”.
Mas a resposta a este argumento fica para um futuro artigo.
(*) Alexandre Semedo de Oliveira é Juiz de Direito.
Seja o primeiro a comentar!