Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
5 min — há 7 anos — Atualizado em: 2/14/2018, 4:32:52 PM
De novo, mais um tropeção na ladeira esburacada das realizações (e dos sonhos). Outra imagem, mais uma repetição no curso médio, já são várias, o aluno (o Brasil) até agora não conseguiu entrar na faculdade. Faz anos, lá estudam primos como a França e o Canadá. Vem ainda à cabeça a frase atribuída a de Gaulle: “O Brasil não é um país sério”. Loser... Paro por aqui, chega, tantas outras comparações deprimentes poderiam ainda ser lembradas, algumas das quais pipocam na imprensa e na rede.
Vamos ao fato. A Standard & Poor’s, agência de classificação de riscos, abaixou a nota de crédito do Brasil, de BB para BB-. O empurrão aproxima o país da zona dos caloteiros, onde se encontram Cuba, Venezuela, Moçambique, Angola (já sob plenos efeitos das maravilhas do socialismo), distanciando-o da região dos que têm o hábito de pagar as contas e despertam confiança nos negócios, como Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, França (que sofrem os horrores do capitalismo).
No fundo do horizonte enxergamos horrorizados a perspectiva da Brazuela, ou seja, a situação brasileira pode ficar cada vez mais parecida com a da Venezuela, onde hoje muita gente do povo briga aos tapas por comida de cachorro. Nem todos se alarmam, porém. Marcus Pestana, deputado federal tucano, estadeou sinceridade escarrapachada:
“A classificação de risco que interessa à esmagadora maioria dos deputados é o risco eleitoral”. Preocupação com o Brasil, zero. Contudo, não busquemos a saída escapista, jogar toda a culpa no cangote dos políticos, somos nós que os elegemos e por nossa culpa a qualidade vem caindo.
Em geral vivem em nossa região, são nossos conhecidos. E o próximo Congresso, pressentimento generalizado, terá qualidade moral igual ou inferior ao atual. Tudo isso agrava a sensação de beco sem saída.
Com o rebaixamento da nota, normal, se a direção da economia não mudar, para órgãos públicos e empresas privadas o dinheiro no Exterior vai ficar mais caro, haverá menos aplicações de estrangeiros entre nós, crescerá a desconfiança com os rumos da economia. Em suma, tendência para a carestia, menos emprego, menos renda; mais sofrimentos, de modo especial para os pobres.
Em um primeiro momento, Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, jogou o fardo da culpa no Congresso. Recebeu o troco: “Resposta de um candidato, uma pena”, declarou Rodrigo Maia, presidente da Câmara.
“Muitas vezes ultrapassamos os nossos limites para entregar o que a equipe econômica pedia”, rebateu Eunício Oliveira, presidente do Senado. Michel Temer entrou em campo e acabou com o bololô que piorava ainda mais a situação. Os três atores passaram a agir combinados.
Em resumo, voltou brava a sensação de que vivemos em país que não dá certo. Se quisermos, nação com a sina do azarado, que com amargura repete, Deus é brasileiro. Complexo de vira-latas. “Por complexo de vira-latas entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro precisa se convencer de que não é um vira-latas”, definiu-a assim Nelson Rodrigues, o criador da expressão. Como deixar de ser vira-latas?
O cientista político Bolívar Lamounier arrisca explicação de fundo, aplica-se à atual situação de desencanto: “O fator preponderante nos retrocessos e rupturas sempre foi a falta de convicção das elites, sua falta do mais elementar bom senso e sua covardia quando o exercício da autoridade governamental se fez necessário. A República de Weimar e o Brasil de 1961-64 são bons exemplos. Dói constatar […] o Brasil não se livrou de uma classe política virtualmente desprovida de responsabilidade pública”.
Ponho as palavras do cientista político como meu aeroporto a partir do qual vou tentar voar um pouco. Acho, toca em dois pontos centrais, o primeiro, elites como fator indispensável do bem comum. E a pessoa começa a pertencer à elite, quando nela brota preocupação com o bem comum. Decai à medida que vai se apagando o senso do bem comum.
Falo de todos os tipos de elite, operárias, sociais, intelectuais, esportivas, militares, artísticas, empresariais, publicitárias, morais, sei lá mais o quê. Precisam ter convivência harmônica, unidas pela noção viva que a primeira entre elas é a elite moral.
Enquanto o Brasil não tiver um sem-número de corpos sociais que, em cada âmbito, estimulem o movimento de ascensão, nosso futuro será de chorar. Boa parte da ascensão vem da admiração profunda pelos “role models” autênticos, faróis, a começar na família. E da família embebendo até os mais recônditos desvãos da sociedade.
Nesse ambiente surgiria organicamente uma elite política benéfica ao País. A representação estaria muito mais ligada à excelência que ao dinheiro, a táticas eleitorais, a recursos publicitários. Assim e não batendo pé nos ataques bestas às elites, encontraríamos rumo.
Vou me fixar agora em um aspecto do assunto. Lamounier fala de covardia, falta de elementar bom senso, inexistência de responsabilidade pública na classe política brasileira. Tem razão, acrescento um ponto. Lembrou-me livro, publicado em 1927, que fez furor na França e na Europa, La trahison des clercs de Julien Benda. Clercs aqui quer dizer intelectual, homem das letras.
Entre outros aspectos, Julien Benda falou ali da tendência que tem o intelectual à covardia e à falsidade. O que nos empurra para a necessidade dos bons hábitos morais. Subjacente a qualquer programa de governo estão os bons costumes. Sem bons costumes, até o melhor programa fracassará.
Por que digo tudo isso? Para propor uma medida prática. Brasília vive imersa na corrupção, está ali nos dirigentes quase morto o senso do bem comum (o segundo ponto do texto comentado). Apenas um exemplo: temos 60 mil assassinados por ano no país, nas estradas morrem cerca de 50 mil, 600 mil ficam lesionados, gravemente ou nem tanto.
De cada dez motoristas parados na virada do ano, seis foram autuados (ou sejam, apresentavam riscos ou estavam ilegais). Não desperta horror, mas é um quadro terrível de desordem, indisciplina, falência do poder público, acobertado pela impunidade e corrupção.
Nesse ambiente, como evitar o complexo do vira-latas? Pelo menos tentemos votar direito (moralidade + iniciativa privada), as eleições estão na porta. E procurar que outros em nosso círculo de relações também o façam. Já seria um bom começo.
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