Cruzada de orações pela Igreja no próximo Sinodo
15 min — há 10 anos — Atualizado em: 9/1/2017, 8:54:21 PM
Festa de Corpus Christi, origem e significado
Conforme Santo Tomás de Aquino, “todos os sacramentos estão ordenados para a Eucaristia como para o seu fim”. O Doutor Angélico ainda afirmou que a dádiva do Divino Sacramento é “uma graça de heroísmo na luta, e que seu efeito próprio é não só o de amortecer em nós o fogo das paixões, como o de tornar-nos invencíveis contra todas as potências infernais”. Ele defendeu a tese de ser o Santíssimo Sacramento o maior dos milagres operados por Nosso Senhor Jesus Cristo, o sacramento por excelência, a maravilha das maravilhas, o “Maximum miraculum Christi”.
Nesse mesmo sentido, Santo Agostinho, de modo muito inspirado, assim se manifestou sobre esse milagre divino: “Que Deus, como ser infinitamente sábio e infinitamente poderoso, não poderia e nem saberia dar-nos mais precioso mimo do que o da Eucaristia; visto que, neste dom, se nos dava a Si mesmo”.
Impossível maior manifestação de amor de Deus pelos homens, segundo o Apóstolo São João. “Tendo Jesus amado aos seus, que estavam no mundo, amou-os até ao extremo” (Jo 13,1).
Não seria, portanto, ingratidão para com Nosso Senhor Jesus Cristo desprezar essa tão excelsa manifestação do amor divino, se recusássemos esse “alimento espiritual” que Ele misericordiosamente nos concedeu? Claro que sim. Ademais, seria desprezar uma graça que aumenta nossa união com Deus, que nos propicia uma prelibação da visão beatifica; uma dádiva que nutre nossas almas, fortifica nossas virtudes, conserva e aumenta em nós a vida da graça (a vida sobrenatural); que nos dá forças para vencer as tentações, dominando nossas paixões desordenadas; além de apagar os pecados veniais, nossas faltas leves.
Segundo definição do Concílio de Trento (1545 – 1563), a Eucaristia é “um antídoto que nos purifica das faltas que cometemos todos os dias e nos preserva de quedas mortais”.
Nosso Senhor, em sua extrema manifestação do divino amor para com seus filhos neste mundo, nas vésperas de sua Crucifixão, Ressurreição e subida ao Céu, instituiu o sacramento eucarístico na Santa Ceia, a última com os Apóstolos, para não nos abandonar nunca, permanecendo na Terra até fisicamente presente no sacrário. Não apenas de modo simbólico, mas verdadeiramente presente sob as aparências das Sagradas Espécies consagradas (o pão e o vinho). Assim, habitando sempre entre nós — para ouvir nossas súplicas e atendê-las quando necessárias para nossa salvação eterna — cumpriu-se esta promessa divina: “Eu estarei convosco até a consumação dos séculos” (Mt 28,20).
Testemunharam-no os Apóstolos e registraram os Evangelhos: “Enquanto ceavam, Jesus tomou o pão, e o benzeu, e o partiu, e deu-o a seus discípulos, e disse: Tomai e comei; isto é o meu corpo. E, tomando o cálice, deu graças e deu-lho dizendo: Bebei dele todos. Porque isto é meu sangue (que será o selo) do novo testamento, o qual será derramado por muitos para a remissão dos pecados” (Mt 26, 26-28).
“Sacerdos alter Christus” (O sacerdote é um outro Cristo). Como ensina a Santa Igreja, na parte mais importante da Missa, que é a Consagração — pelo poder conferido por Nosso Senhor aos Apóstolos ao ordenar “Fazei isso em memória de mim” (Lc 22,19) —, a substância do pão de trigo e do vinho de uva converte-se em seu corpo e alma substancialmente, e em estado glorioso, impassível, intangível e invisível. O sacerdote na Missa — que é a renovação incruenta do sacrifício do Calvário — pronunciando as palavras sacramentais durante a Consagração, “agit in persona Christi” (atua na pessoa de Cristo). O sacerdote não diz “Tomai e comei, isto é o corpo de Cristo”, mas, sim, “Tomai e comei, isto é o meu corpo” — neste momento dá-se a “transubstanciação”, como muito apropriadamente denomina a Igreja.
Com efeito, no Concílio de Trento, a respeito da presença real e substancial de Jesus Cristo nas espécies eucarísticas, foi promulgado: “No sublime sacramento da santa Eucaristia, depois da Consagração do pão e do vinho, Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, está contido verdadeira, real e substancialmente sob aparência das coisas sensíveis”.
Uma vez que no Santíssimo Sacramento da Eucaristia Nosso Senhor encontra-se verdadeiramente presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade, não é uma grande graça poder visitá-Lo com frequência? Não é considerado uma grande honra visitar um rei? Imagine-se então quão grande é a honra poder visitar o Rei dos Reis, o Senhor do Céu e da Terra — sempre à nossa disposição nos sacrários, tanto das ricas e imponentes catedrais quanto das pobres e simples capelinhas!
Se fôssemos convidados a visitar uma rainha — por exemplo, a Rainha da Inglaterra —, não nos prepararíamos primorosamente para tal visita e a faríamos com todo respeito?
Se assim é, com razão ainda maior devemos visitar o Santíssimo Sacramento e receber a Sagrada Comunhão com sumo respeito, numa atitude de adoração, estando em estado de graça (sem a mancha de qualquer pecado mortal). É sapiencial tradição da Igreja recebê-la de joelhos e sobre a língua; no caso das senhoras, cobertas com o véu na cabeça e convenientemente vestidas.
Não estando em estado de graça, deve-se primeiro purificar a consciência, arrependendo-se e confessando-se antes de receber a Comunhão. Como adverte São Paulo Apóstolo: “Todo aquele que comer este pão ou beber o cálice do Senhor indignamente, será réu do Corpo e do Sangue do Senhor. Examine-se, pois, a si mesmo o homem, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Porque aquele que o come e bebe indignamente, come e bebe para si a condenação, não distinguindo o corpo do Senhor” (I Cor. 11, 27-29).
Consonante com essas palavras do Apóstolo, o Concílio de Trento reafirmou: “Ninguém cônscio de pecado mortal, por mais contrito que se julgue, se aproxime da Sagrada Eucaristia sem ter recebido antes o Sacramento da penitência”.
Para nós, simples mortais, a transubstanciação é um mistério, o“Mysterium Fidei”. Cremos porque nos é ensinado pela Fé, que nos leva a crer em Deus e em todas as coisas que Ele faz, mesmo que nos pareçam incompreensíveis. “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1).
A Eucaristia é um altíssimo mistério, que excede a pobre inteligência humana, pois nossos olhos mortais não veem senão o pão e o vinho. Mas temos a certeza que é o Corpo de Cristo, pois para Deus NADA é impossível.
De modo muito expressivo e poético, um dos hinos compostos por Santo Tomás de Aquino para adoração do Santíssimo Sacramento, o “Adoro te devote”, assim canta essa misteriosa e sublime verdade de fé:
“Eu te adoro com afeto, Deus oculto, que te escondes nestas aparências. A Ti sujeita-se o meu coração por inteiro e desfalece ao te contemplar.
A vista, o tato e o gosto não te alcançam, mas só com o ouvir-te firmemente creio. Creio em tudo o que disse o Filho de Deus, nada mais verdadeiro do que esta Palavra da Verdade”.
Se do nada Deus criou todo o Universo, não poderia Ele mudar a substância do pão e do vinho em seu Corpo e Sangue? — Responde o grande Santo Ambrósio: “Se acreditamos que Deus pode criar do nada todos os seres, não deveremos crer mais facilmente que possa permutar uma substância por outra? Se todos os dias, por virtude natural, e não menos incompreensível, o pão e o vinho se transformam no corpo e no sangue daqueles a quem serve de alimento, por que não haveremos de crer que, por divina virtude, os mesmos objetos se transformem no corpo e no sangue de Jesus Cristo?”.
Entretanto, em algumas ocasiões, Nosso Senhor misericordiosamente nos desvendou o mistério eucarístico, mostrando-se realmente presente na Hóstia Santa por meio de comoventes milagres. Estes confirmam a presença Real do Homem-Deus na Eucaristia, e, assim, fortalecem a fé de muitos de nós que, como São Tomé, às vezes precisamos “ver para crer”.
Impossível elencar nas páginas disponíveis para este artigo todos os prodígios operados ao longo dos séculos, que confirmam a presença Real na Eucaristia, mas nos deteremos em um que neste ano completa 750 anos exatos. Um milagre portentoso que está na origem da expansão das festividades públicas em honra do Santíssimo Sacramento, as procissões de Corpus Christi. Antes, porém, algumas linhas explicativas sobre a origem de tal celebração.
As maiores manifestações públicas da fé no dogma da Presença Real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia são as festas de Corpus Christi — como as belas e já conhecidas celebradas solenemente em diversas cidades de norte a sul do Brasil, com suas ruas enfeitadas com “tapetes” de flores etc.
A origem do festa de Corpus Christi remonta a uma religiosa agostiniana, Santa Juliana de Cornillon (1193 – 1258), a quem Deus revelou a conveniência para a Igreja de uma celebração dedicada a glorificar o Santíssimo Sacramento. Esta grande devota da Eucaristia foi superiora da abadia de Mont-Cornillon de Liège (Bélgica), fundada em 1124. Neste lugar de recolhimento, surgiu um movimento eucarístico que incentivou várias práticas de adoração à Hóstia Consagrada, como a Exposição e a Bênção do Santíssimo Sacramento.
Em 1246, Santa Juliana pediu ao bispo de Liège, Dom Roberto de Thorote, a instituição da festa de ação de graças pela presença Real, em Corpo e Alma, de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia. O Bispo concordou com a celebração na diocese, mas não chegou a ver cumprida a solenidade, pois faleceu no mesmo ano.
Somente em 1250 o Cardeal Cher, também de Liège, decidiu instituir em toda a diocese a nova festividade. Assim, a primeira celebração, com o nome de “Fête-Dieu”, foi realizada no interior da igreja de Saint-Martin, num cerimonial dirigido pelo próprio Cardeal.
Desenvolveremos com mais detalhes para os leitores as festividades de Corpus Christi em Orvieto (Itália). Sem dúvida uma das mais bonitas, ou mesmo a mais bela manifestação em honra do Santíssimo Sacramento. Em qualquer caso, é considerada a primeira procissão de Corpus Christi realizada publicamente.
Sobre um plateau a 300 metros de altitude, tendo a seus pés uma planície repleta de formosos vinhedos, Orvieto, com um pouco mais de 20 mil habitantes, situa-se mais ou menos a 100 km ao norte de Roma. A “Cidade do Corpus Christi” — como é denominada — possui notáveis monumentos medievais, sendo o mais importante o Duomo — o “Lírio das Catedrais” [foto]. Sua frente foi classificada por Plinio Corrêa de Oliveira como “a mais bela fachada da Cristandade”. Dedicado à Virgem Santíssima, é uma obra-prima da arte gótica italiana, floreado por preciosos mosaicos e baixos relevos (retratando fatos do Antigo e do Novo Testamento), além de afrescos de Fra Angélico e de Luca Signorelli. Sua construção teve início em 1290 para que fosse um grandioso escrínio no qual ficasse dignamente conservado e venerado o “Milagre de Bolsena”.
— Que milagre é esse? Encontrei sua narração no livro Leituras Eucarísticas (Editora Vozes, 1935), do Frei Mariano Wentzen. Eis um pequeno resumo:
Entre os milagres realizados pela Santíssima Eucaristia, o de Bolsena (província de Viterbo, diocese de Orvieto) é o mais conhecido, pois está na origem da festa de Corpus Christi (ou Corpus Domini). Em 1264, o Padre Peter, oriundo de Praga, empreendeu uma viagem desde sua região (a Boêmia) até Roma. Embora fosse um sacerdote piedoso, ele desejava revigorar sua fé na Cidade Eterna, pedir ao Papa alguns esclarecimentos e expor-lhe dúvidas a respeito da doutrina da transubstanciação. Como vimos acima, durante a Consagração, ocorre a mudança da substância do pão e do vinho em Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo — permanecendo, contudo, na aparência do pão e do vinho.
Diversos e preciosos gonfalões são portados no solene cortejo de Orvieto. Neste acima, a representação da “Missa de Bolsena”, durante a qual se operou o impressionante milagre eucarístico.
Chegando à cidade de Bolsena, o referido sacerdote celebrou a Missa na Igreja de Santa Cristina. Foi esta a última vez que as dúvidas de fé sobre a presença Real de Jesus na Santíssima Eucaristia o atormentaram!
No momento da Consagração do pão e do vinho, na Sagrada Hóstia ocorreu uma efusão do preciosíssimo Sangue, que começou a transbordar e gotas verteram-se sobre o corporal (tecido de linho branco que fica debaixo do Cálice), tingindo-o de sangue.
Assustado com aquele inexplicável acontecimento, o sacerdote primeiro procurou esconder o sagrado corporal, pois julgava que isso ocorrera em castigo devido às suas dúvidas de fé. Mas o sangue transpôs o linho e quatro gotas caíram sobre os degraus do altar, deixando impressos no mármore sinais evidentes do adorável Sangue.
Não podendo mais ocultar o milagre, foi à procura do Papa Urbano IV — que se encontrava em Orvieto, cidade bem próxima de Bolsena — para se confessar e narrar o acontecido. Assim, o Papa mandou trazer à sua presença aquele corporal e ordenou uma apuração meticulosa, que resultou na comprovação inequívoca do milagre.
Daí a edificação da Catedral de Orvieto para a guarda e veneração do sacrossanto Corporal — objeto de grande devoção não apenas dos italianos, mas de pessoas do mundo inteiro que para lá se dirigem. Quanto ao mármore sobre o qual pingaram gotas do preciosíssimo Sangue, conserva-se até hoje na Igreja de Santa Cristina de Bolsena, onde ocorrera o impressionante milagre, outra prodigiosa comprovação da presença Real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Hóstia consagrada.
Com a bula Transiturus de hoc mundo, de 11 de agosto de 1264, Urbano IV estendeu a todo o Orbe católico a Festa de Corpus Christi, a ser celebrada publicamente de modo solene pelas ruas e praças. A data da comemoração foi fixada para a quinta-feira após o dia da Santíssima Trindade. O dia escolhido foi em memória da celebração da primeira Missa por Nosso Senhor, na última ceia no Cenáculo, que foi na Quinta-Feira Santa, quando instituiu o incomparável Sacramento da Eucaristia.
Também o Papa Urbano IV pediu a Santo Tomás de Aquino para compor cânticos para se festejar com maior esplendor o dia de Corpus Christi. Ele então compôs cinco hinos em louvor ao Santíssimo Sacramento — o “Lauda Sion”, “Adoro Te Devote”, “Pange Lingua”, “Sacris Sollemnis” e “Verbum Supernum”. Conta-se que para a criação de um dos hinos, o Papa encomendou a São Boaventura e a Santo Tomás, mas quando o Romano Pontífice fez leitura em voz alta do ofício composto por Santo Tomás, São Boaventura, despretensiosamente, foi rasgando a sua composição… Tal hino é o célebre e belíssimo “Lauda Sion” (Louva Sião).
A partir da determinação de Urbano IV para se festejar o dia de Corpus Christi, uma soleníssima procissão se realiza todos os anos pelas encantadoras ruas de Orvieto. Antes de seu início, logo pela manhã, no interior da Catedral é realizada com grande pompa a cerimônia da exposição e adoração da Santíssima Eucaristia. Segue-se a celebração da Missa solene. Logo depois tem início a magnífica procissão, com o venerável Corporal percorrendo as ruas da cidade, cujas casas ornam suas janelas e sacadas com bandeiras, tapeçarias e maravilhosos arranjos florais.
Atualmente, quase mil personagens em preciosos trajes medievais, representando as diversas classes sociais (desde a alta nobreza, passando pelos cavaleiros, pelos homens de justiça, pelas confrarias de estudantes e pelas corporações ofício até o povo miúdo) desfilam em homenagem ao Sagrado Corporal e ao Santíssimo Sacramento.
O histórico e solene desfile é dividido por quatro bairros da cidade, cada um com suas bandeiras e cores próprias. Muitos dos hábitos medievais usados no cortejo são confeccionados em riquíssimos tecidos, alguns de seda e veludo, outros bordados em ouro e prata — como se pode observar nas fotos. Alguns trajes constituem verdadeiras obras de arte confeccionadas pela célebre “Manifattura LISIO”.
Dando um brilho ainda mais especial ao cortejo, observamos brasões e armas das famílias nobres da cidade, bem como armaduras, couraças, escudos, capacetes, feitos cuidadosamente à mão por armeiros de renome.
Imbuída de charme, sacralidade e grandeza, esta é a solene cerimônia de Corpus Christi de Orvieto, que tive a graça de assistir no dia 2 de junho de 2013, certamente a mais bela procissão do gênero que se realiza no universo em honra de Nosso Senhor Jesus Cristo Sacramentado. É razoável que assim seja, uma vez que o “Milagre de Bolsena” está na origem da primeira procissão pública de Corpus Christi, que depois foi pouco a pouco se multiplicando pelo mundo inteiro.
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Para a matéria completa acesse: http://blogdafamiliacatolica.blogspot.com.br/2014/06/o-santissimo-sacramento-da-eucaristia-e.html
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