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Plinio Corrêa de Oliveira
IPCO em Ação

Salutares benefícios das Cruzadas para a paz e para a ordem


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Joseph-François Michaud (*)

Detenhamo-nos uns instantes ante o espetáculo que se acaba de realizar e que tivemos sob nossas vistas, no qual vemos duas religiões disputar o mundo com as armas na mão; voltemos atrás nossos olhos e vejamos o que aquela grande revolução das guerras santas produziu para as gerações contemporâneas e o que ela devia deixar depois de si, para os povos do Ocidente.

Muitas vezes repetimos, falando desta primeira guerra santa, onde o Oriente viu um exército de seiscentos mil cruzados, que Alexandre, tinha conquistado a Ásia com trinta mil homens.

Sem repetirmos o que já foi dito, limitar-nos-emos a fazer observar que os gregos de Alexandre, em sua invasão do Oriente, só tinham que combater contra os persas, nação efeminada e que a Grécia desprezava, enquanto que os cruzados tiveram que combater contra uma multidão de povos desconhecidos e que, chegando à Ásia tiveram que se haver com várias nações de conquistadores.

Não é demais dizer-se que aqui duas religiões armaram-se uma contra a outra; entre os cristãos e os muçulmanos, só poderia haver uma guerra de extermínio; se as guerras religiosas são sempre as mais sangrentas, são também as mais difíceis para o vencedor estender ou conservar as conquistas.

Essa observação é muito importante para apreciarmos o resultado e mesmo o caráter da primeira cruzada e das que a seguiram.

O que os homens esclarecidos não podiam compreender nesse grande movimento de nações, era o motivo milagroso que animava os chefes e os soldados.

“Que pensar, diz o Abade Guibert, que escrevia alguns anos depois da cruzada, ao ver os povos agitarem-se, e, fechando seu coração a todas as afeições humanas, lançarem-se de repente num exílio, para derrotar os inimigos do nome de Cristo, transpor o mundo latino e os limites do mundo conhecido, com mais ardor e alegria, do que jamais demonstraram os homens quando correm para alguma festa ou prazer?”

O mesmo cronista acrescenta que, no seu tempo, não se fazia mais a guerra a não ser levado pela ambição e pela avareza, e por paixões profanas e odiosas.

Como o ardor dos combates era mais ou menos geral e arrebatava as populações (é sempre a ideia do Abade Guibert), Deus suscitou novas guerras, que seriam empreendidas pela glória do seu nome e que ele mesmo conduziria.

Guerras santas que ofereceriam um meio de salvação aos cavaleiros e aos povos, guerras, onde os que tinham abraçado a profissão das armas poderiam, sem renunciar aos seus hábitos e sem encontrar obstáculos, de qualquer espécie, sair do século, obter a misericórdia divina.

Com efeito, desde que a guerra se viu assim santificada, todos correram para ela e quiseram marchar sob as bandeiras de Deus.

Um dos caracteres maravilhosos dessa cruzada, é que ela foi anunciada antecipadamente, quase em todo o universo.

Quando as revoluções estão para acontecer, um secreto pressentimento se apodera dos povos.

Sabemos os mil prodígios que tinham precedido o belicoso despertar da Europa cristã.

Os muçulmanos tiveram-lhe também os presságios; vários sinais vistos no céu lhes haviam anunciado que o Ocidente ia se levantar contra eles.

Durante a permanência de Roberto, o Frisão, em Jerusalém, doze anos antes do concílio de Clermont, todos os chefes do povo muçulmano haviam se reunido, desde a manhã até à noite, na mesquita de Omar; lá haviam estudado nos livros de sua lei as ameaças proféticas das constelações; souberam com conjeturas quase certas, que homens de condição cristã viriam a Jerusalém e se apoderariam de todo o país, depois de grandes vitórias; mas não se conseguiu saber em que tempo se verificariam tão sinistros presságios.

Assim, à medida que o tempo se aproximava, o Ocidente e o Oriente esperavam vagamente grandes coisas.

No religioso ardor que abrasou o fim do século XI, duas paixões dividiram a sociedade cristã: a primeira impelia os homens à vida solitária e contemplativa; a outra os levava a percorrer o mundo e a procurar a remissão de seus pecados no tumulto e no torvelinho das guerras santas.

Templarios antes da batalha

Por um lado, dizia-se aos cristãos: “É na solidão que se encontra a salvação, é lá que o senhor distribui suas graças, é lá que o homem se torna melhor e mais digno da misericórdia divina”.

Por outro lado, repetiam-lhe sem cessar: “Deus vos chama em sua defesa; é no tumulto dos campos de batalha, nos perigos da guerra santa, que obtereis as bênçãos do céu”.

Estas duas opiniões tão opostas eram pregadas com o mesmo êxito e encontravam partidários em todas as camadas do povo, apóstolos e mártires.

Entre os mais fervorosos dos fiéis, uns não viam outro meio de agradar a Deus, que sepultar-se no deserto; outros julgavam santificar sua vida percorrendo com a espada na mão e a cruz sobre o peito, as regiões mais afastadas.

A necessidade da solidão e o zelo da guerra sagrada eram tão ardentes, que jamais a Europa viu tantos solitários e tantos soldados, jamais se viram erigir tantos mosteiros como no século XII e jamais se viram tantos e tão numerosos como formidáveis exércitos.

Não procuraremos caracterizar esse estranho contraste; mas, parece-nos que um único homem seria aqui suficiente para explicar todo um século e esse homem é Pedro, o Eremita

Lembremo-nos de que o pregador da cruzada obedeceu ora a uma, ora à outra das opiniões do seu tempo. Dotado de imaginação ardente, com espírito volúvel e irrequieto, dedicou-se antes à vida austera dos cenobitas e em seguida, apresentou-se no meio daquela multidão que tinha tomado as armas à sua voz, e voltou para finalmente morrer num claustro.

Pedro, o Eremita, foi então eminentemente o homem dos tempos em que viveu, por isso ele exerceu tão grande influência sobre seus contemporâneos.

__________________
(*) Autor: Joseph-François Michaud, membro da Academia Francesa de Letras e da Academia da Saboia, jornalista e político de intensa vida, e autor de obras célebres, como a história das Cruzadas.
Fonte: “História das Cruzadas”, vol. II, Editora das Américas, São Paulo, 1956. Tradução brasileira do Pe. Vicente Pedroso, páginas 72-83.

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